A frase que vou escrever a seguir parece título de filme. Essa é a mais longa semana do ano que vivemos. No domingo será conhecido o vencedor da disputa pela Presidência da República entre o atual presidente, Jair Bolsonaro (PL), que concorre à reeleição, e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Se não acontecer nada fora da curva, o eleito será conhecido quando a apuração acabar. Fora isso é só especulação. A eleição de 2022 poderá ser uma reedição de 2014, quando a então presidente Dilma Rousseff (PT) buscava a reeleição contra o então senador Aécio Neves (PSDB). Durante a maior parte da apuração, Aécio ficou à frente de Dilma. No final, ela ganhou por 3 milhões de votos. A história dessa eleição foi contada em números, comparando com a atual disputa, no programa Central das Eleições, na GloboNews. No primeiro turno, Lula venceu Bolsonaro por 6 milhões de votos. Qual será a diferença de votos que elegerá o próximo presidente do Brasil?
Essa pergunta será respondida na noite de domingo quando a apuração foi concluída. Até lá, só temos previsões. Andei especulando sobre o assunto. Deixei de lado as pesquisas de intenção de votos feitas por empresas especializadas e as previsões dos entendidos no assunto – há um vasto material publicado nos noticiários. Liguei para 30 pessoas que conheço pelo interior do Brasil, principalmente agricultores – pequenos, médios e grandes. Como escrevi no meu post de 14 de janeiro de 2022, Os gaúchos estão “atando uma carreira” na eleição entre Bolsonaro e Lula, existe uma tradição que vem de muito longe entre os moradores do interior, que é a de fazer apostas durante as eleições. Quanto mais acirrada ela for, mais apostas são feitas. Lembro-me que, na eleição para presidente de 2002, eu andava pelo interior de Não Me Toque, pequena cidade agrícola no norte do Rio Grande do Sul. Estava conversando com um dos maiores produtores de sementes de soja do Brasil sobre o avanço das lavouras nas terras da fronteira gaúcha com o Uruguai, região até então tradicional da pecuária. No final da entrevista a política entrou na conversa. Ele me perguntou se eu queria fazer uma aposta com ele. Em brincadeira, eu disse: “Vocês apostam até em cuspe a distância”. Ele respondeu, rindo: “A ideia é boa”.
Entre as 30 pessoas do interior do Brasil com quem conversei existe uma espécie de consenso de que nenhum dos candidatos ganhará a eleição por uma montanha de votos. Estão repetindo o que os analistas políticos têm dito nos noticiários. Fui mais além na conversa. Insisti para que chutassem a diferença de votos que o vencedor fará sobre o adversário. Mais da metade disse que o ganhador fará uma diferença de 8 milhões de votos. Com a ajuda de um colega, falei com um cabo eleitoral no oeste do Paraná, região que foi povoada por gaúchos. Perguntei-lhe se, caso o candidato desse uma grande mancada durante o debate na Rede Globo, ele comprometeria a sua eleição? Na opinião dele, só comprometeria se a mancada virasse notícia nacional nos noticiários das redes de TV. Acrescentou ao seu comentário: “A maioria dos eleitores não tem saco para ficar grudado na televisão vendo debate. Muito menos acompanhando pelas redes sociais.” Na sua opinião, a maioria dos eleitores que ainda não decidiram em que vão votar tomará a decisão no domingo pela manhã no caminho para a urna. A rotina de vida dessas comunidades agrícolas é simples. Durante o plantio e a colheita, que somam uns quatro meses, os agricultores trabalham todo o dia e metade da noite. Uma boa parte do resto do tempo eles dedicam ao lazer: como os torneios de futebol nos fins de semana. Nessas ocasiões, eles vão à missa ou ao culto logo nas primeiras horas da manhã. Depois iniciam-se as partidas de futebol. Ao meio-dia, eles almoçam churrasco com cuca, maionese, bebem cerveja, cochilam nas sombras das árvores e depois recomeçam os jogos, que se prolongam até o final da tarde. Para esses eleitores, a eleição mais importante é a do prefeito, porque decide sobre as suas necessidades básicas, como estradas, saúde pública e ensino.
Não é por outro motivo que os prefeitos são considerados cabos eleitorais de grande importância para os candidatos que disputam cargos estaduais e federais. Neste ano, eles têm um concorrente, que são os pastores das igrejas neopentecostais erguidas nas favelas das grandes cidades e também nos rincões perdidos do Brasil. Os pastores aliados de Bolsonaro não estão só defendendo o seu candidato nos seus sermões nos templos. Eles estão batendo de porta em porta nas comunidades, pedindo voto. Eles sempre foram ativos nas campanhas políticas. Mas este ano estão exagerando. Conversei com um desses pastores, ele é meu amigo e convivemos durante a infância e a adolescência lá em Encruzilhada do Sul, pequena cidade no interior do Rio Grande do Sul. Atualmente ele trabalha em um templo na Região Metropolitana de Porto Alegre. Desde que virou pastor, na década de 60, mistura a fé com a política. E se alia a quem está no poder. Continua o mesmo. Só que com mais convicção. Como a maioria dos meus colegas, eu tenho escrito que o governo federal tem dois pilares que o sustentam: os chamados Generais do Bolsonaro, que integram um contingente de 6 mil militares – ativa, reserva e reformados – ocupando postos na administração pública. E os parlamentares do Centrão. Durante a campanha eleitoral, os pastores neopentecostais estão sendo o terceiro pilar de sustentação do governo. Nas favelas, eles estão batendo de porta em porta em busca de votos.
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Carlos Wagner é repórter, graduado em Comunicação Social — habilitação em Jornalismo, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul — Ufrgs. Trabalhou como repórter investigativo no jornal Zero Hora (RS, Brasil) de 1983 a 2014. Recebeu 38 prêmios de Jornalismo, entre eles, sete Prêmios Esso regionais. Tem 17 livros publicados, como “País Bandido”. Aos 67 anos, foi homenageado no 12º encontro da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), em 2017, SP.