A série experimental de vídeos satíricos online do Washington Post, Mouthpiece Theater, feita pelos jornalistas Dana Milbank e Chris Cillizza, chegou ao fim na semana passada em meio a controvérsias. Foram, no total, 16 episódios e um deles – que fez piada com Hillary Clinton – ajudou a ‘matar’ o programa, revela o ombudsman do Post, Andrew Alexander, em sua coluna de domingo [9/8/09].
Concebido em referência ao programa Masterpiece Theatre, exibido na emissora pública PBS, a série cômica do site do Post atraía audiência cada vez maior. Mas a decisão da direção do jornal de acabar com os vídeos foi tomada após a exibição do episódio do dia 31/7, que satirizou o encontro do presidente Barack Obama nos jardins da Casa Branca com o professor de Harvard Henry Louis Gates Jr., o sargento James Crowley, do Departamento de Polícia de Cambridge, Massachusetts, e o vice-presidente Joe Biden. Para lembrar do caso: há algumas semanas, Crowley respondeu a um chamado de suspeita de invasão de domicílio, e acabou prendendo Gates em sua própria casa, por conduta desordeira; o caso gerou um debate sobre racismo, já que o professor é negro. Obama, que acabou envolvido na polêmica ao afirmar, em uma coletiva de imprensa, que a polícia havia agido de forma ‘estúpida’, convidou os dois envolvidos para ‘uma cerveja’ para selar a paz.
No vídeo de humor, Milbank e Cillizza brincam com marcas de cerveja que os políticos podiam ter pedido. Uma delas, a ‘Mad Bitch’ (Vaca louca, tradução livre), é associada à imagem da secretária de Estado Hillary Clinton. As críticas dos internautas foram imediatas.
Muitos erros, alguns acertos
Para o ombudsman, houve uma sucessão de erros. O conceito da série humorística foi falho, pois poderia ter a participação apenas de Milbank, que já expressa suas opiniões em coluna no jornal. Já Cillizza é repórter – e não colunista – do blog político The Fix, no site do Post. Suas matérias também aparecem nas páginas de notícias do jornal. Ao se unir a Milbank, criou-se um problema para ele e para o Post, pois deixou os leitores confusos sobre seu papel – repórter, comentarista ou comediante? – e sobre os padrões do diário. Depois do fim da série, ele acabou reconhecendo o problema.
Em segundo lugar, é sempre arriscado realizar este tipo de humor. No mesmo episódio das cervejas nos jardins da Casa Branca, Gates pede a cerveja Big Black Stout (marca de cerveja escura) e Crowley escolheu a White Rascal (marca de cerveja clara). Críticos acharam a brincadeira insensível em relação às questões raciais. Mesmo se tratando de comédia, alusões a raça e gênero são um convite a problemas. O que pode ser engraçado para alguns, pode ferir outros. O manual do Post é claro: ‘evite esteriótipos’.
Em terceiro lugar, houve falta de controle de qualidade da série. Segundo Alexander apurou, não havia um controle rigoroso dos episódios antes de eles irem ao ar. Os roteiros eram revisados, mas não todas as imagens. No final da semana passada, um novo sistema foi criado. De acordo com uma nota interna, editores têm que revisar todos os vídeos que vão ao ar no site, observando ‘a precisão e o bom senso’.
A explicação dos motivos que levaram à remoção do vídeo do site também foi ruim. Após a controvérsia ter surgido no sítio liberal Talking Points Memo, a direção do jornal pediu a retirada do esquete. Aqueles que tentavam acessar o episódio no site do Post encontravam a mensagem de que o vídeo havia sido removido por ‘conter material inapropriado’. Seria melhor se uma explicação mais completa tivesse sido divulgada. O pior aconteceu: mesmo fora do site do jornal, o vídeo espalhou-se pela rede.
Por último, as desculpas. A diretora de comunicação do Post, Kris Coratti, divulgou uma declaração alegando apenas que um episódio satírico que atingiu pessoas de todos os tipos foi removido, por ter ido ‘longe demais’. Cillizza desculpou-se, de maneira curta, a seus seguidores no Twitter. Posteriormente, o Post divulgou desculpas dele e de Milbank.
Apessar de tudo, Mouthpiece Theater tinha de bom a coragem pela experimentação. Cillizza e Milbank encontraram um modo de atrair a audiência online. A redação precisa de pioneiros nas novas mídias, dispostos a assumir riscos, diz Alexander.