Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A euforia mal disfarçada

Desde que foi anunciado o resultado da eleição presidencial no Chile, onde o oposicionista Sebastián Piñera derrotou o governista Eduardo Frei, os jornais brasileiros vêm sendo entulhados de análises e declarações sobre as possibilidades de repetir-se no Brasil um resultado eleitoral semelhante, a despeito da grande popularidade do presidente Lula da Silva.


As abordagens escolhidas por cada veículo são sutilmente distintas, mas podem ser classificadas entre aquelas que não dissimulam a euforia e as que buscam manter algum distanciamento político.


O Globo e a Folha de S.Paulo foram os primeiros a embarcar no entusiasmo provocado pela eleição do empresário Piñera, apontado pela imprensa brasileira como de ‘direita’, se é que essa expressão ainda carrega algum significado relevante. O Estado de S.Paulo reproduziu as declarações de políticos de ambos os lados, destacando, obviamente, as celebrações entre oposicionistas.


O Globo e a Folha foram além, encomendando artigos de seus colaboradores e multiplicando manifestações de colunistas em torno da tese segundo a qual popularidade não ganha eleição, necessariamente.


O mote central é demonstrar que, a despeito da alta aprovação popular, a atual presidente do Chile, Michele Bachelet, não conseguiu eleger seu candidato.


Notícia escondida


As análises têm deixado de lado diferenças fundamentais entre o Chile e o Brasil. Uma delas: Sebastián Piñera é um empresário que se desloca de uma posição conservadora para propostas de centro-esquerda, enquanto no Brasil o movimento dos partidos no poder, desde a primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso, tem sido percebido como uma tendência oposta.


O caráter pragmático e pouco ideológico das alianças políticas no Brasil também se diferencia dos quatro blocos que disputaram o governo do Chile. Além disso, não se levam em conta as diferenças de tamanho, complexidade e momento histórico entre os dois países.


Muitos outros aspectos aconselham a imprensa a conter o entusiasmo e oferecer mais inteligência aos leitores. Mesmo porque a vida de Sebastián Piñera não será um mar de rosas.


Na edição de quinta-feira (21/1), o Estado de S.Paulo noticia – embora discretamente – que o empresário, considerado o homem mais rico do Chile, já está envolvido em um escândalo: ele ganhou 332 milhões de dólares em apenas dois dias, com a valorização das ações de suas empresas, impulsionada por sua vitória eleitoral. Além disso, está sendo acusado de impor restrições a jornalistas durante as entrevistas, exigindo que não o questionem sobre seus negócios.


O Globo e a Folha esconderam essa notícia.