Para Fernando Oliveira Paulino, professor de Comunicação da Universidade de Brasília e ex-membro da Comissão Organizadora Nacional da Conferência de Comunicação (Confecom), o resultado da Conferência foi além do esperado. Pautas importantes dos movimentos da sociedade civil foram aprovadas, como a necessidade de expansão do acesso à internet por meio da banda larga e a criação de um órgão regulador para a área.
Paulino, que também é pesquisador do Laboratório de Políticas de Comunicação (LaPCom-UnB), acredita que é necessário manter a mobilização da sociedade para acompanhar a implementação das resoluções aprovadas na Confecom, por meio da continuidade da Comissão Nacional Pró-Conferência e das comissões estaduais que se formaram.
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Qual a avaliação geral que você faz dos resultados da 1ª Conferência Nacional de Comunicação?
Fernando Oliveira Paulino – Eu avalio os resultados da I Conferência Nacional de Comunicação do ponto de vista conceitual, a meu ver, melhores do que eu esperava pelo menos nessa etapa nacional diante dos problemas operacionais que ocorreram. A sistematização das propostas e o envio de informações dos delegados foi muito precária, a gente teve que fazer um amplo mutirão para garantir que os delegados chegassem a Brasília da maneira adequada e também houve um problema sério com o credenciamento das pessoas, com a sistematização das proposta que tinham sido aprovadas pelos GTs. Mas, de qualquer forma, ao buscar viabilizar isso e distribuir esse material durante as plenárias finais, a gente conseguiu superar esse problemas estruturais que existiram na conferência.
Quais as questões aprovadas que você avalia como os maiores avanços da Conferência?
F.O.P. – Muitas das demandas que a sociedade civil brasileira tinha com relação à comunicação foram colocadas nas propostas que foram aprovadas diretamente nos GTs (grupos de trabalho) ou mesmo nas plenárias, no que tange acesso à internet, mais especificamente expansão da banda larga, estabelecimento de políticas que assegurem a criação de um órgão regulador para área, políticas de fomento.
Quais destas você acredita que de fato serão transformadas em lei ou até mesmo em políticas públicas?
F.O.P. – Eu tenho a expectativa de que essas propostas se transformem em projetos de lei, no que se refere à necessidade de positivação, digamos assim, dessas questões ligadas ao direito à comunicação. Mas eu também imagino que haja possibilidades de efetivação das propostas sem necessidade direta, em alguns casos, do Poder Executivo e do Poder Legislativo. Por exemplo, houve uma proposta de estímulo à criação de ouvidorias nas instituições de comunicação, nos veículos de comunicação, e isso não necessariamente depende de que haja uma lei para que essa medida seja colocada em prática. Na UnB (Universidade de Brasília) a gente tem estimulado a criação de uma ouvidoria dentro da TV Universitária, que deve quem sabe ser implementada ainda esse ano. Foi tema até de trabalho de conclusão de curso lá e que não necessariamente depende de uma ação direta ou indireta do Estado para que seja colocado em prática.
Alguma delas você acredita que ainda saem nesse governo?
F.O.P. – Eu acredito que algumas das propostas que eu mencionei antes podem sem implementadas ainda neste governo. No que se refere à banda larga eu tenho a expectativa que o Plano Nacional seja colocado em prática nesse ano de 2010.
Quais você considera mais urgente de serem implementadas?
F.O.P. – Eu acho que a banda larga é um dos temas mais urgentes de serem implementados, mas, claro, que tão urgente quanto isso é a necessidade criação de um órgão regulador e de um Conselho de Comunicação para acompanhar a implementação das propostas que foram discutidas no âmbito da Conferência Nacional de Comunicação. Nas outras áreas que já têm conselhos nacionais estabelecidos, já há uma dificuldades para que os conselhos sejam colocados em prática, na área de saúde educação, etc. Que dirá em um setor em que nós temos uma histórica situação de ausência de um marco normativo, essa fragmentação política por um lado – vários órgãos da administração direta responsáveis por temas ligados à comunicação, tais como Ministério da Justiça, no que se refere à classificação indicativa, o Ministério da Cultura, na promoção do audiovisual – e, por outro lado, associado a essa fragmentação política, a dispersão normativa porque a gente não tem um marco legal para área, além de um órgão regulador. A necessidade de uma discussão sobre o marco normativo é essencial de ser feita o quanto antes.
Por outro lado, quais foram as piores resoluções aprovadas pela Confecom?
F.O.P. – Não acho que houve piores resoluções, pelo menos, a priori. Acho que os três setores que participaram da Confecom saíram satisfeitos. Empresários saíram satisfeitos com os resultados, membros da sociedade civil também e os representantes do poder público idem. Então, eu não saberia te dizer quais são as piores resoluções.
Você acha que valeu a pena o esforço do governo e de setores da sociedade civil para manter a todo custo os empresariados na Conferência?
F.O.P. – Eu acredito que a participação dos empresários foi interessante. Superou também as minhas expectativas, no que diz respeito à etapa nacional. Acho que houve possibilidade de se criar acordos, de se criar pactos que podem ser implementados. Eu não diria a todo custo. Mas foi um processo positivo para os empresários e foi positivo também para o amadurecimento dessa discussão no Brasil. E até para contrastar com as críticas das instituições que saíram no meio do processo.
Como você analisa as críticas à Confecom feitas por setores empresariais que se retiraram do processo, como, por exemplo, a Globo que chegou a dar editoriais no Jornal Nacional dando a entender que a conferência foi um processo antidemocrático?
F.O.P. – No caso específico dos editoriais do Jornal Nacional eles desconsideraram o processo como um todo, afinal de contas houve amplas condições de diálogo, de negociação em relação às demandas que as seis representações empresariais tinham feito lá na comissão organizadora. Isso o meu ver faltou nas críticas que estavam lá no Jornal Nacional e faltou, claro, o contraditório, porque haveria necessidade de eles, ao fazerem esse editorial dando essa postura, também ter dado algum espaço de voz, de direito ao contraditório, para as organizações que têm uma compreensão diferenciada.
Como você avalia a correlação de forças que se estabeleceu entre os setores presentes: sociedade civil, sociedade civil empresarial e estado? Se puder fale um pouco sobre a atuação de cada um desses setores na Confecom.
F.O.P. – Do que eu vi lá, o Poder Público obviamente não tinha uma ordem unida, porque ele era um segmento bem diversificado, com interesses regionais, com várias pautas, então não houve uma votação em bloco por parte do poder público. Os empresários ao longo do tempo mantiveram uma unidade que atingia grande parte dos representantes das entidades empresariais, mas também surgiu no âmbito da Conferência a possibilidade de criação de uma associação, de uma federação das empresas que não estão associadas a grandes grupos de distribuição, isso vai ser um fato novo interessante, uma pauta boa para o Observatório do Direito à Comunicação.
E no âmbito da sociedade civil, eu achei que foi sensacional a apresentação de pauta e também uma coisa interessante que a gente vai ter que ao longo do tempo, o impacto disso que dialoga com a primeira pergunta que foi feita, que é a possibilidade de parceria independentemente dos três poderes. Eu te digo um pouco de um caso local aqui em Brasília. A gente teve uma deficiente como representante dos delegados, a Manuela, da Etapa Digital, e isso trouxe um debate que fez com que surgisse a possibilidade de parceria com os acadêmicos que estavam na organização da Conferência Distrital, com o pessoal do Movimento Negro sensibilizado com a temática dela e de outras pessoas claro, mas que estavam ali de alguma maneira sendo representados por ela. Eu achei que isso foi bem interessante.
Essa possibilidade de a gente colocar em contato pessoas com demandas diferenciadas e que podem ser encontradas, e com isso fazer com que as pautas se expandam e que cada um as conheça, que tenha o olhar do outro com relação a todas essas questões de comunicação, cidadania, acessibilidade, inclusão social, mobilização social. Então eu acho que nesse aspecto também a Conferência foi um passo importante. Eu espero que a gente continue com essa mobilização, que continue com a Comissão Nacional Pró-Conferência e essas comissões estaduais pró-conferência para que a gente não perca toda essa energia acumulada, para que tenha condições de acompanhar a implementação das políticas e das ações e conseguir até trocar boas práticas, que é uma coisa muito necessária no Brasil.