Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O papel da comunicação no desenvolvimento

Novos desafios e ambições batem à porta do Brasil neste 2010. Se o desejo do país for alcançar ou, pelo menos, visualizar um padrão mais humano e sustentável de desenvolvimento, atingindo, com isso, patamares mais aceitáveis de qualidade de vida, é preciso agir agora. A mídia pode ter um papel fundamental nessa ação, pensando-se na relação comunicação e desenvolvimento. Os processos midiáticos – em particular os relativos à televisão, com sua potencialidade renovada a partir da digitalização – podem estimular e acelerar tais dinâmicas, conformando uma sociedade capaz não só de conhecer seus problemas, mas de debatê-los racionalmente e formular alternativas que coletivamente possam alavancar a estrutura social.

Agir profundamente na reformulação da estrutura societária, incluindo aqui o Estado e sua relação com a sociedade civil, passa por repensar o mega-mercado de comunicações no Brasil, altamente concentrado e atravessado por lógicas privatizantes, na condução das dinâmicas de midiatização, de forma mais acirrada tratando-se de radiodifusão. Assim será possível dar alguns passos na criação de condições mínimas favoráveis ao enfrentamento da pobreza, das desigualdades sociais e da exclusão generalizada, instituindo ferramentas para estabelecer uma sociedade mais justa, ambientalmente equilibrada e com vocação de uma economia com empregabilidade.

Fora da agenda eleitoral

Nessa linha, a pauta da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada em dezembro de 2009, em Brasília, deve ser retomada em 2010, o que se estende às experiências pré-conferenciais realizadas nos planos municipais e estaduais. A partir daí o Brasil poderá munir-se de elementos para buscar diminuir sua dependência externa, uma variável sempre relativa, em tempos de capitalismo globalizado. Sem essas mudanças não será viável consolidar novos agentes, nem dotá-los de instrumentos indispensáveis à resolução (via negociação entre as diversas forças) de prioridades e execução eficaz de medidas que visem superar essas disparidades, as quais assolam e impedem a população de acompanhar a projeção econômica e política do país no cenário mundial.

É necessário que esse movimento seja articulado de forma organizada e protagonizado não apenas por um setor social, de maneira a constituir-se em um trabalho conjunto e eficiente. Deve-se ir além da relação desigual do Estado como servidor dos agentes de mercado, subvertendo essa posição histórica. Tal mudança requer a sociedade civil – enquanto conjunto de agentes capazes de propor e fiscalizar a implementação e a execução de novas medidas – como geradora de propostas de políticas públicas, considerando o plano comunicacional como espaço meio, para midiatização de todas as demandas sociais, e fim, como construto capaz de impulsionar as formas de ser e estar dos cidadãos na coletividade, gerando posicionamento esclarecido e renda, direta e indiretamente.

Se o desafio do Brasil é realizar uma reforma estrutural-distributiva, a fim de resgatar a dívida social (ultrapassando os projetos de renda mínima e criando alternativa real e duradoura de oportunidade e emprego), isto envolve a redistribuição dos mecanismos comunicacionais. Os próximos cinco anos (o último do governo Lula e os quatro de seu sucessor) serão decisivos para o encaminhamento dos rumos do país. A confrontação desses desafios requer medidas de curto, médio e logo prazos. No entanto, até por ser um tema do total desinteresse dos grupos midiáticos hegemônicos, tornou-se árido e tem ficado de fora da agenda eleitoral. Por isso, cabe à sociedade puxar a temática da comunicação para o debate dos candidatos aos vários cargos eletivos.

Qualidade de vida deve ser prioridade

Portanto, 2010 pode ser o ano também da Comunicação, preparando a 2ª Confecom, a acontecer em 2011. Democratização da comunicação passa pela alteração na estrutura oligopólica do mercado atual, cujos resultados têm sido danosos para a democracia brasileira e o próprio auto-reconhecimento de grande parte da população, na medida em que é excluída simbolicamente. Contudo, requer também outras medidas, essencialmente com a aposta na pulverização das possibilidades de fazer produtos simbólico-culturais, assim como distribuí-los, o que abrange mídias com menores barreiras à entrada, como a internet, e, ao lado disso, necessariamente, uma nova alocação de espaços televisivos, através da abertura de janelas para tal por parte dos atuais canais públicos, mas igualmente por meio da outorga de emissoras para movimentos sociais.

A posição do Brasil é vergonhosa, no que tange a índices de qualidade de vida. O modelo de desenvolvimento capitalista em operação exclui do mercado e dos recursos da vida civilizada dezenas de milhões de brasileiros. Estima-se que o Brasil possui 16 milhões de analfabetos, número que, conforme recente pesquisa divulgada pelo Ministério da Educação (MEC), cresce para 33 milhões, levando-se em conta o analfabetismo funcional, que inclui as pessoas que não concluíram a quarta série. A esses dados devem ser acrescentados os que asseguram que a população brasileira vê o apresentador do Jornal Nacional como o segundo homem mais confiável do país, num ranking onde despontam figuras como Ivete Sangalo e Hebe Camargo. Portanto, são muitos os caminhos para realmente se reforçar que elevar a qualidade de vida do brasileiro deve ser uma prioridade.

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Respectivamente, professor titular no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos; e mestre em Ciências da Comunicação e graduado em Comunicação Social pela mesma instituição