Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O negacionismo informativo da extrema direita

(Foto: Pixabay License)

O episódio protagonizado pelo senador Marcos Do Val mostrou como a imprensa ainda tem uma grande dificuldade em lidar com a estratégia errática e contraditória adotada pela extrema direita brasileira e mundial na arena da informação pública nacional e internacional.

Ao produzir de forma quase industrial um grande volume de dados, fatos e eventos sem coerência, veracidade e menosprezando a lógica vigente na cultura política do país, os adeptos do populismo no estilo fascista transplantam para o espaço público o negacionismo informativo.

Os extremistas de direita procuram semear a desorientação informativa entre as pessoas por meio da proliferação de notícias falsas produzidas pelos chamados gabinetes do ódio, pelo uso constante de declarações contraditórias e pela repetição pouco convincente de pedidos de desculpas. 

Os episódios registrados em Brasília (2023) e Washington (2021), ambos em janeiro, deixaram claro que há duas tendências diferentes no uso dos meios de comunicação de massa em confrontos políticos. Os grupos de extrema direita se inspiram no negacionismo e no autoritarismo populista enquanto a grande imprensa tende a se apoiar nos valores e normas da democracia liberal. 

Os extremistas de direita não conseguiram produzir até agora um conjunto de ideias que poderiam configurar um programa político/ideológico estruturado. Toda a sua estratégia está focada na destruição e no desmanche das estruturas vigentes e isto se aplica também no terreno da informação e comunicação. A preocupação de grupos como o gabinete do ódio sempre foi espalhar a dúvida e a incerteza, baseados no fato de que a insegurança gera medo e este a passividade. 

O dilema dos grandes jornais é que eles seguem incondicionalmente os valores tradicionais, o que os leva a tratar o populismo autoritário de viés fascista a partir de uma abordagem convencional. Esta abordagem acaba por transmitir para o público a ideia de que os extremistas de direita são pessoas irresponsáveis, sem qualquer preocupação com a lógica e a coerência. O resultado é uma atitude de superioridade que, em alguns casos, pode ser confundida com arrogância e menosprezo.

O caso Do Val

As declarações erráticas e contraditórias do senador Marcos Do Val sobre o envolvimento do ex-presidente Jair Bolsonaro num golpe de estado confundiram a opinião pública, políticos e jornalistas. Aparentemente, foi uma manobra da extrema direita para tentar reduzir o impacto das denúncias do parlamentar ao criar uma polêmica em torno do comportamento do político.

Ações como esta fazem com que a extrema direita consiga ocupar espaços estratégicos na agenda de debates da opinião pública, contando com a cumplicidade involuntária de diversos órgãos da imprensa.  É uma manifestação contemporânea, da velha frase “ Falem mal de  mim, mas falem de mim” atribuída ao escritor Oscar Wilde e usada por políticos populistas como os ex-governadores de São Paulo, Adhemar de Barros (1963-1966) e Paulo Maluf (1979 – 1982).  

A principal dificuldade da grande imprensa é como neutralizar o efeito desestabilizador da estratégia do negacionismo informativo. A insistência na cobrança de argumentos lógicos, do raciocínio linear e sequencial, da coerência e da veracidade não tem dado resultados porque seguem regras e condutas ignoradas pela extrema direita. A principal vítima de todo este conflito entre políticas de comunicação é o público que fica desorientado e, a partir daí, fica vulnerável à disseminação de notícias falsas, factoides e contextualizações distorcidas.

A opção da imprensa democrática é promover uma diferenciação mais clara na sua agenda de notícias, apostando na busca de soluções para os problemas reais da população, justamente o ponto mais débil da estratégia de comunicação da extrema direita. Uma agenda diferenciada vai exigir muita criatividade do jornalismo porque a escolha dos temas precisa estar totalmente sintonizada com as dificuldades concretas das pessoas comuns, especialmente as de menor renda e da classe média. Teorizar sobre as vantagens da democracia serve para balizar os espaços políticos mas é pouco eficiente na fidelização de leitores, ouvintes, telespectadores e internautas.

Uma agenda diferenciada vai exigir também que a imprensa deixe de ser caudatária das preocupações de governos, políticos e empresários para destacar problemas da base social, independente dos temas e preocupações de parlamentares, magistrados ou membros do poder executivo nacional, estadual ou municipal. A imprensa precisa, acima de tudo, se dar conta que polemizar com o negacionismo informativo da extrema direita não leva a nada senão a mais confusão e dúvidas entre as pessoas, contribuindo para abalar a confiança em jornais, revistas, rádios, telejornais e sites noticiosos na Web. 

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Carlos Castilho 
é jornalista com doutorado em Engenharia e Gestão do Conhecimento pelo EGC da UFSC. Professor de jornalismo online e pesquisador em comunicação comunitária. Mora no Rio Grande do Sul.