Um jornalista que ‘aceita’ propina e uma OAB que sempre lutou por liberdades, hoje pede prisão baseada em supostos crimes, ainda em fase de investigação. A entidade caminha na contramão do direito ao contraditório e ampla defesa. Alguns justiceiros de plantão vão torcer o nariz ao ler este artigo, pois são os paladinos da moralidade. Falo mesmo do caso do governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, preso nesta quinta-feira por ordem do Superior Tribunal de Justiça. A OAB encena uma contradição histórica, enquanto o jornalista se presta a um serviço que foge de sua pauta.
Não acho que a prisão José Roberto Arruda seja um ‘suspiro de esperança’, como entendem juízes federais. Parece mais a institucionalização da violação de direitos, aplaudida por quem deveria repudiar. Basta uma observação simples, diante do caso, para levantar uma discussão mais consciente – apenas o Bento foi preso, acusado de corromper o jornalista Edson Sombra, que saiu ileso do flagrante forjado O jornalista, ao menos diante das câmeras da Polícia Federal, recebeu a ‘propina’ arquitetada. Ora, Bento teria praticado corrupção ativa enquanto o jornalista, corrupção passiva. Os dois deveriam ser presos.
O jornalista não foi preso exatamente por se tratar de um flagrante preparado. Ou seja, a polícia combinou com o jornalista para que aceitasse a propina em troca de favores em seus depoimentos contra Arruda. Neste caso, o jornalista, por uma combinação com a PF, seria poupado da prisão, como foi. A súmula 145 do Supremo Tribunal Federal condena o flagrante preparado, não reconhecendo nesses casos a prática de crime.
Medidas autoritárias e justiceiras
Não bastasse o absurdo descrito, o jornalista vira notícia numa circunstância nada recomendável para o profissional de imprensa. A Fenaj precisa se manifestar sobre o ato de ‘heroísmo’ de seu filiado. Por outro lado, a OAB precisa se explicar melhor. Uma entidade que historicamente sempre defendeu as liberdades e o direito de ampla defesa, de repente, do nada, se insurge contra suas tradições e pede a prisão de um acusado, sem que este tenha o direito de se defender. Há algo estranho no reino da OAB.
Ao prender o governador nestas circunstâncias, a Justiça se compromete, pois, considerando os precedentes verificados nas votações do plenário do STF, sua prisão será relaxada e, muito provavelmente, Arruda reconduzido ao cargo, lá permanecendo até o julgamento de seu processo. Vale lembrar que a prisão se deu por fatos publicados em jornais, e não por provas incontestáveis.
Não se trata de defender o governador. Trata-se de defender direitos que se estendem a todos os cidadãos, mesmo os acusados dos mais horrendos crimes. Antes de emitir uma opinião apaixonada sobre este artigo, por favor, olhe para o espelho e reflita sobre uma situação semelhante à do governador, envolvendo você. Cada vez que apoiamos medidas autoritárias e justiceiras, defendemos que nossos direitos sejam desconsiderados sob qualquer pretexto.
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Diretor de jornalismo da Rádio Metrópole AM, São José do Rio Preto, SP