Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Crueldade contra animais nas seções de curiosidades

Muitos portais noticiários on-line possuem uma seção voltada para notícias inusitadas, consideradas bizarras. Recordes e situações esquisitas são os principais temas desses setores. Nada mal até aí. Acontece que alguns desses sites extrapolam o bom senso e inserem notícias nada engraçadas ou inusitadas: animais em situação angustiante, entretenimentos centrados na exploração animal, episódios de caça ou pesca na maioria dos quais há assassinato de animais, comercialização de bichos ‘esquisitinhos’. O bizarro perde o sentido de inusitado, curioso e engraçado e toma ares de mau gosto, falta de compaixão e, em última análise, sadismo e estupidez.

É, infelizmente, comum encontrar esse tipo de notícia pela internet sendo tratado como tão curioso quanto notícias inofensivas. Rinhas de animais em outros países, animais caçados, gatos entalados durante dias em canos ou bueiros, cães perdidos, elefantes ‘treinados’, entre tantas outras notas recheadas de crueldade, dividem o espaço das seções de notícias bizarras como recordes, corpos esquisitos, prisões de bandidos atrapalhados etc.

Notícias que envolvem animais em apuros geralmente têm seus equivalentes humanos postados em seções policiais, cotidianas, nacionais ou internacionais ou simplesmente não publicados. Não esperemos para ver, ao lado de uma notícia de um cão entalado num cano PVC, uma sobre uma criança presa num tubo largo para esgoto porque esta última, ao contrário da primeira, nunca será postada em seções de bizarro.

Indução de crimes ambientais

Os noticiários que postam esse tipo de nota em seções de curiosidades mostram claramente sua visão editorial acerca dos animais: como seres menos dignos que os humanos, como brinquedos utilizáveis para entretenimento, como motivo de admiração ou chacota mesmo quando estão sofrendo ou mortos. Falta-lhes ética, empatia, senso de igualdade moral entre animais humanos e não-humanos.

Além da total falta de senso ético em caçoar dos animais por pôr-se seu sofrimento na seção de curiosidades, ocorre também uma verdadeira ‘educação contra-ambiental’, uma apologia aos crimes de maus tratos contra animais ou caça de animais silvestres. Postagens sobre caça (uma vez foram divulgadas notícias sobre crocodilos caçados por uma criança e um jogador de rúgbi) ou sobre animais com comportamentos anormalmente inteligentes induzidos (como elefantes jogando basquete ou cães pintando quadros, animais geralmente torturados durante o ‘treinamento’) correm o risco de induzir crianças e adolescentes a matarem, ‘treinarem’ ou entalarem bichos para, quem sabe, virarem notícia na seção de ‘bizarrices’ desses portais.

Felizmente vários desses portais criaram seções dedicadas ao mundo animal e estão lhe direcionando notícias, boas, neutras ou ruins, que outrora eram postadas na seção de inusitados. Porém é relevante também que diversos outros resistem em reservar espaços exclusivos a bichos e insistem em misturar seu sofrimento e exploração com curiosidades. Está nascendo uma pressão popular para que esses sites teimosos criem vergonha e ética, mas, ainda fraca e reduzida, vem sendo ignorada.

Postar animais sofrendo ou morrendo em seções de bizarro é uma atitude antiética que deve parar. Chamo a atenção às entidades de defesa dos animais para que tomem logo uma posição sobre esse fato, antes que aconteça o pior – crimes ambientais induzidos pelo status de curiosidade bizarra dado por esses sites. Não podemos mais deixar que o sofrimento, a exploração e a crueldade continuem sendo tratados como coisas inocentes, curiosas e engraçadas.

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Estudante de Ciências Sociais, Recife, PE