Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A ética no sigilo de fonte

Várias questões éticas envolvem a relação de jornalistas com as fontes sigilosas. O repórter deve proteger a identidade do informante? Até onde vai essa proteção? Viola-se o sigilo ao revelar a fonte ao editor? Como saber quando fontes inescrupulosas usam o sigilo para difamar, caluniar e espalhar boatos? Será que os repórteres utilizam o recurso de fontes sigilosas para dar suas próprias opiniões? Este artigo não pretende responder estas perguntas, mas provocar reflexões sobre elas.

Entre o jornalista e a fonte se estabelece uma relação de confiança que pode incluir o compromisso do silêncio quanto à origem da informação. Pelo sigilo, o repórter não é obrigado a revelar a sua fonte, assegurado na legislação de países democráticos. Enfim, ‘é direito do jornalista resguardar o sigilo de fonte’, contempla o Código de Ética dos jornalistas brasileiros.

No Brasil, não há norma jurídica que imponha a quebra do sigilo. Ampara-se na Constituição Federal, que resguarda ‘o sigilo de fonte, quando necessário ao exercício da profissão’ (artigo 5º, inciso XIV). Entende-se que o jornalista, ao omitir a fonte, assume o que foi revelado por ela, respondendo civil e criminalmente.

Indiscrições questionáveis

Uma informação em off (jargão jornalístico, off the record) é fornecida com a intenção de não ser publicada ou, se for, sem a indicação de quem fez a declaração. Cabe à fonte decidir o que pode ou não ser divulgado e ao jornalista, considerar o off ou não. Portanto, configura-se um princípio deontológico, questionado quando infringido.

Geralmente a fonte sigilosa revela informações de interesse público. Mas também pode lançar calúnias, difamações, boatos e intrigas para medir reações. Por isso, para falar em off é preciso que o informante esteja investido do estatuto de fonte, configurado por uma relação contínua de confiança com o repórter e credibilidade. O segredo está vinculado à notoriedade de quem confidencia e à relevância do fato.

Desde que carregado de noticiabilidade e interesse público, qualquer sigilo é passível de publicação, sobretudo porque se trata de informação em primeira mão, geralmente exclusiva. Aliás, o que distingue uma notícia dada em off e outra em on (divulgação consentida e que revela a fonte) é a intenção. Por isso, não se considera extra-oficial uma informação concedida em entrevista coletiva, mesmo que o entrevistado sugira o sigilo.

Pressupõe-se que o repórter, ao receber a informação sigilosa, esteja identificado como tal e exercendo a função. Conversas em ambiente familiar, informal ou mesmo quando o repórter esconde a sua identidade não são consideradas em off. Portanto, não se concebe como infração de sigilo as indiscrições de um jornalista, embora questionáveis do ponto de vista ético.

Discussões e comentários

O jornalista preserva e cultiva as suas fontes por uma questão ética e profissional, pois espera que delas venham outras confidências que orientem o seu trabalho na busca de novas notícias. Em alguns casos, o jornalista vive o dilema de manter em sigilo ou não uma informação sobre um crime, por exemplo, dada em off. São dois deveres, mas a regra geral é a de manter o sigilo profissional e não revelar o segredo, nem em juízo.

Confunde-se ‘fonte sigilosa’ com a ‘fonte indefinida’ ou ‘cega’, que se configura pela não negociação do off ou anonimato. Desta forma, muitas fontes são denominadas de forma vaga ou indireta, geralmente por incompetência do repórter: ‘fonte digna de crédito’, ‘ouviu-se nos corredores’, ‘dizem que’, ‘importante empresário’, ‘conhecedor da matéria’, ‘um participante da reunião’ etc.

Algumas fontes secretas recebem cognomes, como a figura lendária do ‘Garganta Profunda’ (Deep Throat), cujo nome verdadeiro foi mantido no anonimato pelos jornalistas Bob Woodward e Carl Bernstein, do Washington Post, durante o caso Watergate, e que mais tarde foi revelado como sendo o agente do FBI Mark Felt.

Ficam, portanto, as questões iniciais para as discussões, ou melhor, para os comentários.

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Mestrando em Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC