O que é de (des)conhecimento geral
Os jornais reproduzem, nesta quinta-feira (31/7), trechos de declarações da presidente da República e dos seus dois oponentes mais destacados nas pesquisas de intenção de voto.
Foi o primeiro grande evento da campanha eleitoral, sob a forma de uma sabatina promovida pela Confederação Nacional da Indústria em Brasília.
Como não poderia deixar de ser, quase tudo girou em torno da economia, mas o contexto das questões abordadas revela que, mesmo nos assuntos mais recorrentes, a imprensa não consegue sair da superfície.
O núcleo do debate que não aconteceu, porque a presidente e os dois candidatos oposicionistas se apresentaram separadamente diante dos representantes da indústria, foi a questão da reforma tributária.
Trata-se de um desses mitos que se apresentam em nove entre dez discussões sobre economia no Brasil, sem que se conheça uma proposta capaz de reunir meia dúzia de adeptos.
Junto com a questão dos tributos, embarcou clandestinamente no debate o boato, estimulado nas redes sociais, de que, se reeleita, a presidente Dilma Rousseff iria promover um "tarifaço" geral.
Sobre a reforma tributária, candidatos a qualquer coisa costumam navegar nos ventos de uma percepção geral de que o sistema brasileiro é ineficiente, afeta a competividade das empresas nacionais e desestimula investimentos produtivos no País.
Raramente se acrescenta ao debate a observação de que os tributos são também injustos, porque pesam proporcionalmente mais, muito mais, sobre o orçamento dos mais pobres.
O mantra da reforma, repetido exaustivamente pela imprensa, costuma esconder um dos seus pontos mais perversos: o sistema tributário como causa de desigualdade.
Numa sabatina promovida por industriais com os candidatos ao Planalto não se esperava ouvir, por exemplo, referências à taxação de grandes fortunas.
Para o senso comum dos debatedores, com amplo suporte da imprensa, basta o Imposto de Renda para estabelecer a equanimidade entre os cidadãos.
Mas há entre os brasileiros aqueles que recebem a contrapartida de serviços mantidos pelos impostos e a outra parte, que fica ao relento.
Receitas genéricas
Outra questão que frequentou a discussão com os candidatos foi o tamanho do Estado, mais um tema cuja complexidade costuma ficar dissimulada sob a poeira do senso comum.
Provavelmente a mesma proporção de nove entre dez brasileiros entende que deveria haver um enxugamento da estrutura do Estado, mas nenhum dos participantes do seminário foi capaz de apontar que Ministério, que órgão público, deveria ser extinto.
Se o leitor levar adiante sua observação crítica, verá que, em praticamente todas as questões consideradas relevantes, a imprensa constrói discursos homogêneos e superficiais.
Assim, desenvolveu-se no Brasil um cabedal de conhecimento sobre tudo que, na verdade, é formado por um emaranhado de desinformações.
Desde a questão da reforma tributária até problemas distantes da economia, como a idade adequada para a responsabilização penal, tudo é discutido na planura dos lugares-comuns.
O Brasil vive, há muitos anos, um processo de empobrecimento intelectual patrocinado pelos principais meios de comunicação.
O ambiente comunicacional organizado e pautado pela mídia tradicional é o reino das obviedades, terreno fértil para o populismo e a manipulação.
Nesse território se edificam não apenas as carreiras políticas inexplicáveis, como algumas fortunas que desafiam as teorias de sustentabilidade do capitalismo.
Parte dos conflitos que vimos crescer nas ruas a partir de junho de 2013 tem origem nessa incapacidade das instituições de aprofundar a compreensão do Brasil contemporâneo.
Presos a essa roda de ignorâncias por aceitarem a dependência de um sistema de mídia limitador e intelectualmente modesto, governantes que deveriam tomar a iniciativa da mudança não se mostram capazes de inovar.
Os candidatos ao cargo mais elevado do sistema de poder, colocados diante da oportunidade de expor o que se espera sejam ideias inovadoras, repetem velhas receitas genéricas.
A imprensa compra qualquer coisa e repassa ao público o que é o desconhecimento geral do Brasil sobre si mesmo.