No mesmo dia em que vários dos grandes jornais brasileiros usam dois pesos e duas medidas no noticiário sobre a CPI dos Correios, o cientista político e pró-reitor da Universidade Cândido Mendes, Wanderley Guilherme dos Santos, volta à carga para tratar de golpismo em sua coluna no Valor Econômico – desta vez fechando o foco sobre a atuação da imprensa em movimentos de desestabilização política. Na quinta-feira passada, 16/06, ele provocou alvoroço quando apontou que ‘o golpismo de resultados’, dando eco à reação dos dirigentes do PT sobre a enxurrada de denúncias sobre corrupção no governo – tese que foi imediatamente ridicularizada pelos partidos de oposição e por vários jornais. ‘À falta de condições políticas para operar o impedimento do presidente, busca-se paralisar seu governo’, escreveu Wanderley Guilherme dos Santos. ‘Não é difícil, na conjuntura, dada a coincidência de eventos favoráveis ao golpismo de resultados’.
Em sua coluna de hoje, ele volta ao tema com o texto ‘Questão de método: ABC da capitulação’ situando o monopólio da imprensa como um dos fatores de instabilidade política e fragilidade institucional no Brasil e em vários países vizinhos. ‘Em toda a América Latina e Central, não apenas no Peru, na Argentina, na Colômbia, na Bolívia ou no Equador, a grande imprensa e a Igreja, além dos militares e grupos de interesse, sempre constituíram duas fontes potencialmente geradoras de instabilidade política, quando não explícitas patrocinadoras de golpes de Estado’, diz, mencionando associações entre as empresas de comunicação que controlam a mídia e grupos políticos de oposição – tal como ocorre hoje na Venezuela. ‘A volúpia do poder jornalístico se concentra em controlar a pauta dos governos, como controla a pauta de seus repórteres. Ou isso ou a ameaça de desestabilização. É essa a moeda de troca das grandes empresas de comunicação latino-americanas na arena econômica. Foram dezenas as vezes em que os governos capitularam e outras tantas em que não capitularam e caíram, ou foram desmoralizados. E enquanto isso persistir vive-se o período de democracia de instituições vulneráveis a extorsões’.
As afirmações acima são graves pois encontram correspondência na realidade, pois a maioria dos grandes jornais continua tratando os casos de corrupção com dois pesos e duas medidas. Um desses pesos está na adoção do discurso de oposição, por grande parte da maioria dos jornais, de que a compra de deputados deve se limitar ao período do governo Lula. Mas essa é uma questão que será decidida na CPI. Outro é o de considerar como pessoas sérias e honráveis justamente aquelas que estão entre os principais suspeitos, como é o caso do presidente do PTB, Roberto Jefferson, ou do ex-chefe do Departamento de Contratação e Administração de Material dos Correios, Maurício Marinho, flagrado com a mão na propina. Das duas, uma: o crédito sem restrição às acusações do ex-funcionário, indiciado pela Polícia Federal por corrupção passiva e fraude em licitações, evidencia excesso de ingenuidade ou de má-fé. Maurício Marinho lançou suspeitas sobre contratos assinados com o governo de doze empresas – entre eles, grandes anunciantes como Bradesco, Microsoft e Embratel. A maioria não se deu ao trabalho de comentar as ilações.
O foco das acusações do ex-chefe de departamento dos Correios, naturalmente, faz com o que noticiário recaia sobre o ministro da Secom (Secretaria de Comunicação), Luiz Gushiken. Tudo bem, pois se trata de um funcionário público. O painel apresentado abaixo, contém manchetes, chamadas de primeira página, títulos das reportagens e menções dos seis jornais mais influentes do Brasil – Folha de S.Paulo, Gazeta Mercantil, Jornal do Brasil, O Estado de S.Paulo, O Globo e Valor Econômico – registrando as suspeitas lançadas pelo ex-funcionário dos Correios sobre o ministro mais próximo do presidente da República. Ele expõe por si próprio qual jornal foi leviano e qual foi sensato.
Folha de S.Paulo
Título da reportagem: ‘Marinho liga PT a contratos suspeitos’
Menção: ‘Em sua tática de defesa, Marinho tentou fazer conexões entre os supostos contratos irregulares e políticos do PT, como o secretário-geral do partido, Sílvio Pereira, e o ministro Luiz Gushiken (Comunicação de Governo), apontando ainda supostos interesses de parlamentares e de empresas como o Bradesco. Não apresentou, porém, provas’.
O jornal não registra o indiciamento de Marinho por corrupção e fraude.
Gazeta Mercantil
Título da reportagem: ‘Marinho, acuado, lança acusações sem provas’
Menção: ‘Filmado embolsando R$ 3 mil em propina, o ex-diretor de contratações e compras dos Correios, Maurício Marinho, utilizou ontem na CPI dos Correios uma estratégia semelhante à do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ): decidiu atacar sem apresentar provas. Em um depoimento de oito horas, Marinho mencionou 17 grandes contratos supostamente ‘contaminados’ por corrupção nos Correios. Entre os alvos de Marinho estão o secretário de Comunicação, ministro Luiz Gushiken, o secretário-geral do PT, Sílvio Pereira, e o Bradesco. Procurado ontem por este jornal, o Bradesco preferiu não se pronunciar’.
O jornal não registra o indiciamento de Marinho por corrupção e fraude.
Jornal do Brasil
Título da reportagem: Marinho: contratos ‘contaminados’
Menção: mesmo texto da Gazeta Mercantil. Ambos são assinados pelo repórter Hugo Marques.
Não lembra o indiciamento de Marinho por corrupção e fraude.
O Estado de S.Paulo
Manchete Principal: ‘Ex-chefe dos Correios sugere devassa e envolve Gushiken’
Título da reportagem: ‘Marinho envolve Gushiken e sugere devassa na publicidade’
Menção: ‘Em um depoimento de cerca de 12 horas à CPI dos Correios, o ex-chefe de departamento Maurício Marinho elegeu como alvo o PT e aumentou a tensão entre os governistas. Lançou suspeitas sobre a lisura de dois diretores da empresa indicados pelo secretário-geral do partido, Sílvio Pereira, e levou para a CPI o nome do ministro Luiz Gushiken, da Secretaria de Comunicação de Governo, ao defender uma devassa nos contratos do Departamento de Marketing da estatal’.
Não lembra o indiciamento de Marinho por corrupção e fraude.
O Globo
Título da reportagem: ‘Marinho acusa também Gushiken’
Menção: ‘Numa estratégia similar à adotada pelo ex-presidente do PTB Roberto Jefferson, o ex-chefe do Departamento de Contratações dos Correios Maurício Marinho lançou suspeitas ontem sobre pelo menos 13 negócios feitos pela empresa. Num depoimento tumultuado na CPI dos Correios, Marinho centrou fogo no secretário-geral do PT, Sílvio Pereira, a quem atribuiu as indicações dos diretores que comandavam as áreas de Tecnologia e Operações, áreas cujos principais negócios, segundo ele, teriam indícios de irregularidades e deveriam ser investigados pela CPI. Marinho também fez acusações ao secretário de Comunicação do governo, Luiz Gushiken’.
Não lembra o indiciamento de Marinho por corrupção e fraude.
Valor Econômico
Título da reportagem: ‘Marinho lança suspeita generalizada sobre contratos da ECT’
Menção: ‘Ao sugerir que os parlamentares da CPI investiguem os contratos de publicidade feitos entre os Correios e a agência SMP&B, citou o nome do ministro Luiz Gushiken (Secretaria De Comunicação e Gestão Estratégica do Governo), que supervisiona os contratos de publicidade com estatais’.
Registra o indiciamento de Marinho por corrupção e fraude.