Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Três notícias de jornal

Os leitores de jornais brasileiros vão passar alguns dias imaginando que o Brasil mudou de um dia para outro: nas mesmas edições de sexta-feira (5/3), a imprensa registra três fatos que atendem ao chamado clamor público:


1. Por 9 votos contra 1, o Supremo Tribunal Federal decidiu manter na cadeia o governador licenciado do Distrito Federal, José Roberto Arruda;


2. Por 4 votos a 1, o Superior Tribunal de Justiça reabriu os processos contra o banqueiro Daniel Dantas e seus associados;


3. No Rio de Janeiro, a Justiça bloqueou os bens do casal de ex-governadores Anthony Garotinho e Rosinha Matheus, em processo que envolve ainda a família da atriz Déborah Secco.


As três decisões, obviamente tomadas com base na análise fria da jurisprudência e dos fatos, não significam necessariamente que houve alguma mudança no comportamento do poder Judiciário.


Nem se deve concluir, pelo potencial de produzirem algum impacto na opinião do público, que o Judiciário passou a tomar decisões com base no que dizem os jornais.


Apenas se deve observar que, no conjunto, as três notícias dão conta de que nem o poder financeiro de Dantas, nem o poder político de Arruda ou o populismo do casal Garotinho são obstáculos quando a Justiça se move.


Risco de anulação 


O pedido de suspensão do julgamento de Daniel Dantas, acolhido em dezembro por um desembargador do STJ, lançava suspeição sobre o juiz Fausto Martin De Sanctis, que se celebrizou na Operação Satiagraha, em 2008, quando mandou o banqueiro para a prisão, de onde foi tirado rapidamente por decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes.


Dantas já foi condenado em primeira instância por De Sanctis, pela tentativa de subornar um policial para que a operação Satiagraha fosse arquivada. Os advogados do controlador do Banco Opportunity alegavam parcialidade do juiz e queriam tirá-lo do processo.


Se o Supremo Tribunal Federal confirmasse o afastamento de De Sanctis, todo o trabalho da Polícia Federal na investigação das atividades do grupo Opportunity, iniciado em 2004, poderia ser anulado.


Bens bloqueados


A outra decisão judicial que chama atenção foi tomada no Rio, após ação civil pública movida pelo Ministério Público do Estado.


Os ex-governadores Anthony Garotinho e Rosinha Matheus são réus num processo por improbidade administrativa que aponta o desvio de mais de R$ 63 milhões de reais dos cofres públicos. De acordo com a promotoria, o esquema foi montado com o repasse de R$ 410 milhões para 14 ONGs subcontratadas, sem licitação, para o fornecimento de mão de obra para a Fundação Escola do Serviço Público, entre 2003 e 2006.


Parte do dinheiro teria sido desviada para empresas fantasmas, nas contas de responsáveis por ONGs ou seus parentes, ou simplesmente sacada nos bancos.


Segundo os jornais, pelo menos duas empresas criadas especialmente para lavar o dinheiro estão na lista de doadores para a campanha eleitoral de Garotinho à Presidência da República, em 2006. No auge da investigação, naquele ano, o ex-governador chegou a fazer greve de fome. Desta vez, ele se defende através de seu blog, afirmando que se trata de ‘armação eleitoreira’, já que ele quer se candidatar novamente ao governo do Rio.


Direitos políticos 


Já no caso do governador licenciado do Distrito Federal, a notícia não chega a surpreender. Depois de haver sido filmado recebendo dinheiro de propina, de haver inventado a história dos panetones e de haver tentado subornar uma testemunha para atrapalhar as investigações, José Roberto Arruda cometeu o pecado mortal das máfias: tentou envolver no escândalo seu antigo padrinho político, o ex-governador Joaquim Roriz.


Há muitas evidências de que Roriz também tem culpa no cartório, mas, como se sabe no submundo da corrupção, isso não se faz.


Arruda também recebeu no mesmo dia outra notícia desagradável: a Câmara Distrital de Brasília decidiu aceitar, por 19 votos a 0, o pedido de impeachment contra ele. O governador licenciado tem agora vinte dias para apresentar sua defesa, e com mais dez dias do prazo para o relatório final, ainda pode renunciar daqui a um mês e preservar seus direitos políticos, mas é considerado carta fora do baralho do poder.


Num só dia, três notícias de jornal e uma luz no fim do túnel.