Thursday, 19 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

É possível o Lula sem PT?

Faltando mais de um ano para a próxima eleição presidencial, as ações mercadológicas já começaram a emergir fortemente na arena política. Pode-se dizer, entretanto, que não há nada de novo neste cenário. Estranho seria, pelo menos para o campo do marketing político, se os partidos, assim como seus candidatos, não começassem a consolidar alianças e preparar estratégias para o próximo ano. Quanto a isso, tudo corre em perfeita sintonia.

Em contrapartida, surge uma situação nova quanto à possível reeleição do presidente Lula. Com os escândalos envolvendo a imagem do Partido dos Trabalhadores, a partir dos mensalões e das CPIs, o atual presidente da República, fundador e peça-chave do PT, começa a se esquivar dessa relação.

A tentativa de isentar-se das responsabilidades, que envolvem sobretudo o nome de assessores diretos, vem acompanhada de um discurso que distancia Lula cada vez mais do PT. Em fala reproduzida na Folha de S. Paulo no dia 3 de agosto, o presidente Lula afirmou que espera a punição de todos os envolvidos nas denúncias. Nas palavras de Lula: ‘Quem deve pagar, pagará. Seja do PT, católico, evangélico, do PMDB. Não tem cor, não tem raça, não tem sexo e não tem ideologia. Todos precisam pagar.’ Sem alianças políticas definidas e com um partido desintegrado, Lula, no mesmo dia, discursava ao público: ‘Se eu for [candidato], com ódio ou sem ódio, eles vão ter que me engolir outra vez, porque o povo brasileiro vai querer.’

É evidente que os apoios políticos e especialmente um partido estruturado são a base de qualquer campanha. Então, como lançar uma carreira solo? Se existe uma estratégia de marketing no sentido de desvincular a imagem de Lula do PT, com o intuito de tentar uma possível reeleição independente do PT, desenha-se para os executores do projeto uma árdua tarefa. Isso porque, na melhor das hipóteses, estariam sendo contrariadas as bases teóricas do marketing. Vejamos melhor.

A verdade é que PT foi por um bom tempo sinônimo de Lula e vice-versa. Toda a história do partido, sua fundação e construção, sempre esteve atrelada à figura de um homem que emergiu da massa e tornou-se político de imensa representatividade. Pode-se dizer ainda que a história do PT foi sedimentada numa intensa luta em prol da ética na política e contra a exclusão social, na qual Lula aparecia como aquele que finalmente resolveria essa situação. Se transpusermos tal relação para o contexto mercadológico, metaforicamente é claro, poderíamos dizer que Lula representava o produto que melhor definia a marca ‘Partido dos Trabalhadores’.

Seguindo a mesma a linha de raciocínio, o PT, ao contar com Lula como presidente e fundador, tinha nele reciprocidade, apoio. Nesse sentido, era como se a marca PT fosse representada por um produto, no caso Lula, que emprestava a ela um conjunto de valores e atributos que reforçavam muito mais sua imagem e a diferenciava das demais.

Uma simples reflexão sobre marca deixa perceber que uma dada empresa se consolida e estrutura a partir dos esforços presentes na qualidade dos produtos e serviços que oferece, mas o fundamental na construção de uma marca forte é a forma como a empresa se comunica com o público. É por meio da marca, segundo nos esclarece Mauro Calixta Tavares (1998: 21) [TAVARES, Mauro Calixta. A Força da Marca: Como Construir e Manter Marcas Fortes. São Paulo: Harbra, 1998.], que a empresa tenta sintetizar as características do produto, formando uma imagem na mente do consumidor.

Ainda nos esclarece J. B. Pinho: existe, na maior parte das vezes, uma relação de apoio mútuo:

A relação é bilateral: a marca tanto ganha quanto empresta um valor ao produto. Empresta valor ao produto, porque traz no bojo um histórico das suas relações com o consumidor, consubstanciado em uma síntese das suas experiências anteriores, em termos do binômio custo benefício proporcionado pela marca. (PINHO, 1996:43) [O Poder das Marcas. São Paulo: Summus, 1996]

É inevitável, portanto, concluir que há marcas que se tornaram sinônimos de uma categoria. Acontece assim com a marca Xerox para as fotocopiadoras, com a palha de aço para a marca Bombril, com os barbeadores para a marca Gilette e tantas outras. Tal ocorrência, na visão dos profissionais de marketing e comunicação, mostra o quanto é importante uma marca bem criada e aplicada no mercado. Quando bem-estruturada, essa associação marca-produto traz a impossibilidade de desvinculação. A relação é inquebrável na mente do consumidor.

Ora, se transpusermos tais teorias para a relação estabelecida entre Lula e o PT, pode-se afirmar que é inquebrantável e indissociável o vínculo que se formou desde 10 de fevereiro de 1980, quando o atual presidente da República fundou o partido; desde então, vem dedicando sua vida política a ele.

Cabe dessa forma a análise da questão que poderá surpreender os teóricos de marketing, permitindo que a prática comprovem ou não suas teorias. É possível desvincular a imagem de Lula do PT, sem prejuízos irremediáveis, como o comprometimento de sua vida política futura?

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Aluna do doutorado em Ciências Sociais da PUC-SP, mestre em Comunicação e Cultura das Mídias pela Unip, São Paulo