Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A cobertura errática da imprensa

O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, integrado por 44 entidades da sociedade civil, realizou em São Paulo, na segunda-feira (8/3), uma manifestação de apoio à aprovação do projeto de lei parlamentar que cria restrições a candidatos com problemas na Justiça. Trata-se de uma rara iniciativa de caráter suprapartidário, na qual se pode identificar a presença de entidades ainda não contaminadas pelo partidarismo e pelas disputas eleitorais. Os participantes são egressos de mobilizações como a campanha Voto Consciente e o Movimento Nossa São Paulo.


Os participantes querem a aprovação do projeto 518/09, chamado ‘projeto da ficha limpa’, originado na proposta de iniciativa popular sobre a vida pregressa dos candidatos, que foi encaminhada à Câmara dos Deputados em setembro do ano passado com 1,6 milhão de assinaturas colhidas por todo o país.


A iniciativa procura definir algum grau de suspeição aceitável por parte da Justiça Eleitoral, de modo que se possa assegurar o princípio da presunção da inocência, garantido pela Constituição, mas também proporcionar mais eficácia na seleção dos candidatos.


Na base de vazamantos


A manifestação, amplamente divulgada pela internet nos últimos dias, não sensibilizou a chamada imprensa de papel. Dos jornais de influência nacional, apenas o Estado de S.Paulo publicou uma notícia na edição de terça-feira (9), com fotografia dos manifestantes mas sem grande destaque.


Paralelamente, a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de vetar as doações ocultas nas campanhas eleitorais continua sofrendo ataques de praticamente todos os partidos, o que rende algumas notas em colunas de jornais.


Depois das grandes reportagens de algumas semanas atrás sobre a deliberação do TSE, a questão da qualidade das candidaturas parece cair na vala comum, como acontece regularmente com os noticiários sobre escândalos envolvendo políticos.


Essa cobertura errática da imprensa, dando grandes manchetes sobre casos ainda em apuração e baseada em declarações de promotores ou com base em vazamento de inquéritos policiais, pode produzir grandes danos à reputação de figuras públicas mas não ajuda a reduzir ou prevenir a corrupção.


Muito barulho por pouco


Já se completa uma década da campanha movida por promotores, com apoio da imprensa, contra Eduardo Jorge Caldas Pereira, ex-secretário do então presidente Fernando Henrique Cardoso, acusado, na ocasião, de intermediar negócios escusos de empresas com o governo.


Ele chegou a ser envolvido no caso que levou à cadeia o ex-magistrado Nicolau dos Santos Neto, condenado a 26 anos de prisão por desvio de dinheiro na construção da sede do Tribunal Regional do Trabalho, em São Paulo.


O ex-assessor de Fernando Henrique Cardoso foi inocentado em todos os julgamentos e chegou a ganhar o direito de resposta na imprensa. Num dos casos mais notórios, o Globo foi obrigado a publicar a sentença em que foi condenado por haver ofendido a honra de Eduardo Jorge.


Impressiona que, dez anos depois, os jornais sigam com a mesma prática. São muito raros os casos em que os suspeitos se deixam filmar ou fotografar com a mão na massa, como ocorreu com o governador licenciado do Distrito Federal, José Roberto Arruda, e seus associados, e com alguns personagens do chamado mensalão do PT. Normalmente, esse tipo de negociata é cometido às escondidas, no retiro dos gabinetes e longe de testemunhas.


Ligações suspeitas


Mais eficiente do que fazer barulho em cima de meras suspeitas seria trabalhar medidas concretas contra o ingresso e a permanência de personagens obscuros na vida pública.


No entanto, a imprensa costuma deixar de lado os movimentos da sociedade para tentar coibir a corrupção na origem, aconteceu nas edições de terça-feira (9/3), e dá prioridade às denúncias espalhafatosas.


Mesmo o noticiário sobre medidas oficiais, que poderia alimentar um debate sobre o tema, aparece fragmentado. Nesta mesma data, por exemplo, enquanto o Estadão cobre a manifestação contra os fichas-sujas, a Folha de S.Paulo informa que as comissões do Congresso estão cheias de parlamentares sob suspeição.


Dos vinte deputados que assumem a presidência de comissões temáticas na Câmara, sete são investigados pelo Supremo Tribunal Federal e cinco receberam doações de empresas com interesses nos temas das comissões que eles dirigem.


Eles já estão lá. E o eleitor precisa saber quem são, para evitar que continuem.


Observatório na TV


O Observatório da Imprensa na TV discute na terça-feira a cobertura das catástrofes. Repórteres vão ao local dos acontecimentos, correm risco, tentam alimentar o sentimento de solidariedade e, então, chegam os editores e homogeneízam a cobertura com suas coleções de clichês. Assista ao vivo, às 23 horas, em rede nacional pela TV Brasil. Em São Paulo pelo Canal 4 da Net e 181, da TVA.