Imagine ser convidado para uma festa com Luis Fernando Verissimo, Lygia Fagundes Telles, Rubem Fonseca, Ferreira Gullar e Zuenir Ventura. O convite é virtual, mas ainda assim irresistível para quem gosta de literatura.
A festa aconteceu na sexta-feira passada (10/12), em comemoração ao aniversário de dois anos do Portal Literal (www.literal.com.br), sítio que tem curadoria de Heloisa Buarque de Hollanda e hospeda as páginas oficiais dos escritores acima – e, de quebra. a revista online Idiossincrasia.
Festa virtual é festa duradoura. Na semana passada foram distribuídos presentes, um pouquinho a cada dia, para comemorar o aniversário. Todos muito úteis para quem gosta de ler ou arrisca uns rabiscos. Para os primeiros, o portal publicou textos exclusivos de Silviano Santiago, Luiz Ruffato e Santiago Nazarian. Para os segundos, uma oficina literária online, gratuita, com Antonio Fernandes Borges. E para o deleite de todos, uma série inédita de Rubem Fonseca, em cinco capítulos.
O conteúdo do Portal Literal é também um presente: na Idiossincrasia, vale a experiência de escrever um conto para a coluna Exercícios Urbanos, discutir questões ligadas a literatura na rubrica Paredão, conferir textos em prosa e poesia ou descobrir páginas de interesse na Blogteca.
No sítio oficial dos cinco autores ali hospedados, uma peculiaridade. Além das biografias e bibliografias, estão os textos preferidos de cada um. No espaço de Lygia Fagundes Telles há cartas de Carlos Drummond de Andrade à amiga e fragmentos de textos não publicados da escritora. No de Verissimo, desenhos animados das ‘Cobras’ e programas de rádio com seleção musical (de jazz) feita pelo escritor.
A edição do portal está a cargo da jornalista e escritora Cristiane Costa. Ex-editora do caderno Idéias, do Jornal do Brasil, Cristiane participou da equipe de criação do portal mas não pôde cuidar dele quando estreou na web, pois dividia seu tempo entre o JB, o doutorado e a Bolsa que ganhara da Fundação Vitae para realizar pesquisa sobre escritores que também foram jornalistas no Brasil.
O portal começou editado pelo jornalista Luiz Fernando Vianna, hoje na Folha de S. Paulo, e Cristiane assumiu em agosto passado, em meio expediente; em tempo integral depois de deixar o JB, em novembro. Sua entrevista:
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Como surgiu o Portal Literal?
Cristiane Costa – Em dezembro de 2002, quando foi criado, o Portal Literal tinha como proposta ser um veículo online para discutir a literatura offline. Até porque reúne os sítios oficiais de cinco escritores consagrados; o que, por sinal, é uma prova de que não são só os novos autores e blogueiros que se interessam em divulgar seus trabalhos na rede. A partir de experiências como adaptar os poemas concretos de Gullar, que no sítio se movem diante do leitor, fomos nos dando conta das enormes potencialidades narrativas do hipertexto quando aplicadas ao jornalismo cultural. E começamos a nos interessar cada vez mais por um novo tipo de literatura que compartilha o mesmo suporte virtual que o Portal. Criamos uma blogteca, abrimos espaço para autores inéditos na coluna Exercícios Urbanos, fizemos um levantamento detalhado dos blogs de ficcionistas da Geração 00 e de blogs de poetas, entre outras coisas. Certamente a internet não é o único caminho para divulgar a literatura brasileira. Os jornais já cumprem, mal ou bem, essa função. Mas ela permite que se crie uma rede de comunicação interativa, unindo escritores, jornalistas, críticos, pesquisadores, editores e leitores. Desta rede podem ser pescadas coisas muito interessantes, literalmente.
Como funciona o portal? A mesma equipe que produz a Idiossincrasia é responsável pelos sítios dos escritores?
C.C. – O portal começou a ser idealizado no final de 2000, por Heloisa Buarque de Hollanda, Luiz Noronha (jornalista que, na época, era responsável pelo braço online da Conspiração Filmes) e eu. Quando já tínhamos investido mais de 200 mil reais na elaboração dos sítios dos autores e na revista, a bolha da internet estourou e o projeto foi engavetado. Há dois anos, foi retomado com o patrocínio da Petrobras e apoio da Livraria Cultura. Nós cuidamos da revista, com atualização diária, e dos sítios dos escritores. O contato online com eles também é feito via Portal. Os cinco estão sempre lançando livros e participando de debates, o que por si só já dá muito material para a Idiossincrasia. Mas, além disso, nós temos a preocupação de ser um espaço aberto a gente nova, novas idéias e novas tendências. Queremos também prestar um serviço para o leitor ou escritor, sistematizando informações dispersas na internet, indicando bolsas, prêmios, blogs e sítios. A idéia é não competir com os jornais, fugir das resenhas e privilegiar debates, reportagens, entrevistas e ensaios. Nosso xodó é a seção Paredão, em que os leitores são provocados a entrar em polêmicas literárias, como a validade do conceito de geração para a literatura, por exemplo.
Como foi a escolha dos escritores que teriam seus sítios hospedados pelo Portal?
C.C. – A escolha foi feita pela Heloisa Buarque de Hollanda, a pessoa que mais tem idéias por minuto, geniais ou loucas, com quem já trabalhei. Dizer que ela é criativa é até pouco. Por ser capaz de dar voz a essas idéias em pouco tempo, sem aquele processo industrial todo do jornal ou de uma revista, a internet me parece o lugar perfeito para gente assim. É bem mais divertido editar online. Por enquanto não haverá novos nomes; esses cinco já dão o maior trabalho [Luis Fernando Verissimo, Lygia Fagundes Telles, Rubem Fonseca, Ferreira Gullar e Zuenir Ventura]. Eles são sócios do Portal, seus verdadeiros donos.
Além de jornalista você é também escritora. Um ofício atrapalha ou ajuda o outro?
C.C. – Não me considero uma escritora com E maiúsculo. Tenho um romance para adolescentes chamado Amor sem beijo e dois livros de não-ficção: Eu compro essa mulher: romance e consumo nas telenovelas brasileiras e mexicanas, que é uma versão mais divertida da minha dissertação de mestrado, e Coisas que eu diria a minha filha se ela topasse ouvir, uma espécie de mãe-ajuda, também voltado para adolescentes. No próximo ano, a pesquisa sobre a vida dos escritores no jornal, de Machado de Assis e José de Alencar até hoje, sai em livro, pela Companhia das Letras. Gastei umas 300 páginas e três anos de trabalho intenso para tentar responder sua pergunta. Tendo a concordar com Hemingway, que também serviu muito tempo a estes dois senhores ciumentos: a experiência no jornalismo é muito boa para um escritor, desde que ele saia a tempo.