**
‘Nós treinamos bastante durante a semana e esperamos conseguir um bom resultado.’**
‘A gente respeita o adversário, mas vamos buscar os três pontos.’**
‘É, eu tive a chance e graças a Deus consegui fazer o gol.’**
‘Com certeza, vamos ouvir o professor e tentar melhorar no segundo tempo.’Poderíamos escrever um artigo inteiro, até mesmo um livro, somente com frases ‘básicas’ do mundo do futebol. Ditas por jogadores, treinadores, dirigentes, elas viram motivo de piada e diversão para jornalistas e, por que não, para a sociedade. Há razões sociais compreensíveis para o baixo nível de cultura no mundo futebolístico, um mundo onde alguém que more na Pindaíba (relembrando o comercial de TV), ganhe 100 reais por mês e mal tenha o que comer, no dia seguinte, após marcar um golaço na final do campeonato, mude-se para o Rio de Janeiro, passe a ganhar pelo menos 100 vezes mais e, o principal: torna-se estrela de cinema! Como já disse Ronaldinho Gaúcho uma vez, ‘quando eu não era famoso eu era um dentuço feio, agora sou um dentuço simpático’.
Mas essa não é a questão principal, porque muitos são os jogadores com nível cultural acima da média no meio. Estes, porém, são indiscriminados, não pelos colegas, e sim pela imprensa. É esse o ponto de que quero tratar.
A imprensa esportiva é a maior responsável pelo marasmo da cobertura de futebol. Se os jogadores de futebol respondem sempre a mesma coisa é porque os jornalistas fazem sempre as mesmas perguntas. ‘E aí, Fulano, preparado para a partida?’; ‘Você acha que dá para virar o jogo no segundo tempo?’; ‘O que você sentiu ao marcar o gol?’; ‘O que você achou do jogo?’. E por aí vai. Falta criatividade aos jornalistas esportivos e vontade de mudar.
Física quântica
Quando um jogador, como o meia Ricardinho, do Santos, ou o goleiro Rogério Ceni, do São Paulo, ambos com discurso próprio, resolvem falar o que pensam, ou simplesmente constatar algo básico, mas que difere da mesmice do dia-a-dia futebolístico, suas declarações viram manchete dos jornais no dia seguinte e elas acabam se voltando contra eles mesmos. Resultado: a mesmice no meio continua imperando, com o aval e o carimbo da imprensa.
Uma boa leitura para consulta é o livro Perguntar ofende! Perguntas cretinas que jornalistas não podem fazer (mas fazem), do jornalista José Nello Marques. Um bom índice do que não fazer. É necessário mudar nossa mentalidade. Fazermos perguntas diferentes, ou pensarmos um pouco antes de formular uma pergunta,. Os leitores merecem. E, principalmente, não tratar respostas ‘diferentes’ como se elas fossem absurdas. Na Espanha e na Argentina, por exemplo, o jornalismo esportivo tem posição mais crítica e opinativa. Com isso, a linguagem fica diferente e as famosas ‘matérias prontas’ ou ‘declarações feitas’, nas quais é preciso apenas mudar datas, equipes e jogadores, deixam de existir.
Não é preciso também fazer perguntas sobre física quântica ou arte contemporânea aos jogadores, mas anos de estudo e muito trabalho podem e devem resultar num melhor resultado para leitores, ouvintes ou telespectadores.
******
Jornalista, Campinas, SP