Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Perguntas mal explicadas pela imprensa sobre o “apagão” de Biden no debate com Trump

(Imagem de Dwinslow3 por Pixabay)

Há um punhado de perguntas que foram mal explicadas pela imprensa em relação ao desempenho do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, 81 anos (democrata), no debate com o ex-presidente Donald Trump, 78 anos (republicano), nos estúdios da CNN, em Atlanta, na noite de quinta-feira (27/6). Durante uma boa parte dos 90 minutos do debate Biden demonstrou ter problemas de raciocínio e de memória. Em consequência disso, foi massacrado por Trump, que falou mentiras na maior parte do tempo, deixando, no jargão futebolístico, bolas picando na área que, em situação normal, Biden chutaria e faria o gol. Nos dias seguintes houve uma chuva de pedidos para que Biden desistisse da candidatura à reeleição. Entre os pedidos merece destaque o amigo do presidente, o colunista do The New York Times Thomas Friedman, que escreveu uma coluna onde diz: “Joe Biden é um bom homem e um bom presidente”. Conclui dizendo que Biden não tem condições de concorrer contra Trump, “um homem malicioso e um presidente mesquinho, que não aprendeu nada e não esqueceu nada. Ele é o mesmo lança-chamas de mentiras”. Todos os grandes jornais estão pedindo para que o presidente desista das eleições. Uma pesquisa de opinião publicada no domingo (30) aponta que 62% dos americanos gostariam que o presidente americano desistisse da candidatura.

Eu acompanhei o debate e as repercussões nos dias seguintes nos Estados Unidos e no Brasil. Realmente, o comportamento de Biden foi estranho. Digo isso com base no fato de que tenho acompanhado a carreira do presidente americano, por entender que a imprensa o trata com preconceito devido à idade. Lembro que durante a campanha eleitoral de 2020, quando Trump concorria à reeleição, fiz o post O dia em que Biden foi rei da Espanha. E Trump foi Hugo Chávez. O atual presidente mandou Trump calar a boca durante aquele debate. Recentemente, em 12 de março deste ano, publiquei o post Presidente Biden pendurou no pescoço de Trump as imagens da invasão ao Capitólio. Falava sobre o discurso do presidente no Congresso americano, quando lembrou que foi Trump quem incentivou a invasão do Capitólio (Congresso) em 6 de janeiro de 2021 tentando reverter o resultado das eleições – há matérias na internet. Aqui vou citar uma pergunta que considerei não ter sido respondida a respeito do desempenho de Biden no recente debate com Trump. Todos consideram que Biden está com problemas de coordenação mental e não tem condições de enfrentar Trump. A pergunta é: se Biden tem problemas de saúde mental, quem está presidindo os Estados Unidos? A imprensa precisa explicar se os problemas apresentados pelo presidente americano aconteceram por questão de estresse, cansaço ou são permanentes. Uma pessoa de 81 anos pode ter o seu dia de cão, né? Mais uma pergunta que se faz necessária. Desde a conclusão do debate, Biden tem frequentado as manchetes dos jornais ao redor do mundo. Claro, a maioria tratando-o como um “velho teimoso que insiste em concorrer sem condições mentais”. Mais importante: estão falando sobre Biden, um homem velho que luta para provar que pode continuar exercendo o seu cargo. Uma luta muito semelhante a que muitos velhos ao redor do mundo vivem diariamente, tentando segurar os seus empregos. Portanto, é uma causa simpática a muita gente.

Há mais uma pergunta que a imprensa precisa esclarecer. Temos noticiado que uma eventual vitória de Trump, que nos dias atuais é considerada como provável, e o bom desempenho no primeiro turno das eleições para o Parlamento da França da extrema direita liderada por Marine Le Pen, que fez 34% dos votos, vão beneficiar os projetos políticos da extrema direita do Brasil, comandada pelo ex-presidente da República Jair Bolsonaro (PL). Na teoria, isso pode acontecer. Mas, na prática, como isso vai acontecer, tendo em vista que uma das principais bandeiras políticas de Trump e de Le Pen é o ódio aos imigrantes? Sendo o Brasil um grande fornecedor de imigrantes para aqueles países, a maioria ilegal. Duvido que a extrema direita brasileira seja chamada por Trump e Le Pen para tirarem fotos juntos. O fato é que os bolsonaristas já estão vendendo para o seu público a ideia de que a eleição de Trump e de Le Pen vão ajudar a pressionar o Judiciário brasileiro, em especial o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a revogar a inelegibilidade de oito anos de Bolsonaro e anistiar as mais de 1,2 mil pessoas que se envolveram na tentativa de golpe de estado em 8 de janeiro de 2023, quando invadiram e quebraram tudo que encontraram pela frente no Congresso, no Palácio do Planalto e no Supremo Tribunal Federal. Conversei com fontes que tenho entre os chamados bolsonaristas raiz no interior do Rio Grande do Sul. Um deles explicou que a desastrada participação de Biden no debate e os resultados da eleição em primeiro turno na França “deixaram a militância faceira”. A palavra faceira no interior gaúcho é usada no sentido de alegre.

Apolítica americana tem lá os seus mistérios. Mas é uma das mais antigas e sólidas do mundo. E vários setores, tanto entre democratas quanto entre os próprios republicanos, têm apontado o dedo em direção a Trump dizendo que ele é um perigo para a democracia do país. Seja lá qual for o destino da candidatura à reeleição de Biden, a imprensa precisa esclarecer as dezenas de perguntas que estão sem resposta após o debate. É necessário tal esclarecimento para saber se nesse episódio houve alguma sacanagem. Tem muita coisa em jogo nessa história.

Texto publicado originalmente em “Histórias Mal Contadas”.

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Carlos Wagner é repórter, graduado em Comunicação Social — habilitação em Jornalismo, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul — Ufrgs. Trabalhou como repórter investigativo no jornal Zero Hora (RS, Brasil) de 1983 a 2014. Recebeu 38 prêmios de Jornalismo, entre eles, sete Prêmios Esso regionais. Tem 17 livros publicados, como “País Bandido”. Aos 67 anos, foi homenageado no 12º encontro da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), em 2017, SP.