Chamem o marqueteiro
Como resposta à pesquisa Datafolha que mostra uma forte queda na sua popularidade e na aprovação de seu governo, a presidente Dilma Rousseff anuncia um plano de comunicação.
Segundo o Estado de S. Paulo, a presidente decidiu dar mais entrevistas e chegou a cogitar um pronunciamento em cadeia de rádio e televisão após o carnaval, de acordo com inconfidência de um ministro que pediu ao jornal para não ser identificado.
Começam e terminam nesse parágrafo quaisquer chances de a presidente vir a reverter os danos à sua imagem com uma estratégia convencional de comunicação: ela não consegue nem mesmo a lealdade de seus auxiliares mais próximos e, supostamente, de maior confiança: muita gente no governo petista sonha em aparecer no Fantástico, daTV Globo, ou ganhar uma entrevista nas páginas amarelas da revista Veja.
O ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega, por exemplo, adorava ser citado em colunas sociais.
Houve tempo, há oito anos, em que a imprensa apontou nos escalões superiores do governo Lula um espião que repassava informações sigilosas para os editores da Folha de S. Paulo.
Planos estratégicos do governo, medidas ainda em estudo e frases mais ou menos curiosas eram repassadas rotineiramente ao jornal por um assessor cujo cargo exigia a mais estrita discrição.
Numa dessas ocasiões, o funcionário foi visto em evento social contando anedotas sobre o então presidente Lula da Silva, que teria colhido durante reuniões no Planalto.
Além da pouca habilidade e da má disposição demonstrada pela presidente Dilma Rousseff para a conversação, seus estrategistas precisam lidar com as disputas internas na base parlamentar do governo e a competição entre as muitas "tendências" que fazem do Partido dos Trabalhadores um balaio de gatos.
No mais qualificado núcleo do sistema de comunicação do partido, ainda há gente que se refere ao ambiente midiático contemporâneo como o "meio cibernético" ou a "blogosfera".
O que os estrategistas da presidente não parecem ter percebido é que o governo se tornou refém de uma imprensa que se comporta como partido político, num cenário de campanha eleitoral que nunca termina.
Faz sentido, portanto, reconvocar o marqueteiro.
Moinhos de vento
Já o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que também aparece na pesquisa Datafolha com a popularidade em queda, pode ter uma reação mais simples: ele diz que sua avaliação caiu porque o Brasil "está em um momento de grande dificuldade", o que se reflete no ânimo da população.
Além disso, segundo ele, os paulistas se preocupam com os efeitos da crise hídrica, que, na sua opinião, é causada por "problemas climáticos".
A vantagem de Alckmin é que ele não precisa fazer qualquer esforço para convencer os jornalistas: diz o que lhe recomendam seus assessores e a imprensa compra qualquer coisa.
O fato de 38% dos paulistas ainda considerarem "ótimo ou bom" o seu governo, ainda que represente dez pontos porcentuais a menos do que sua avaliação anterior, foi comemorado pelo núcleo de comunicação do Palácio dos Bandeirantes como uma boa notícia, diante do risco de um colapso no sistema de abastecimento de água na região mais densamente povoada do País.
Os comunicadores do governo paulista sabem que as mensagens dúbias passadas por Alckmin e agasalhadas pela imprensa sustentam o raciocínio autoindulgente do cidadão que o reelegeu.
Para se arrepender de seu voto e admitir que é, em parte, responsável por sua própria aflição, o eleitor paulista precisaria estar bem informado sobre o contexto da crise, mas em programas populares de rádio e televisão se ouve, por exemplo, que o problema da água é causado porque o governo federal deixou de investir em infraestrutura para construir os estádios da Copa.
E muita gente acredita e repete.
O falecido repórter policial Ramão Gomes Portão costumava dizer, quando se referia a delinquentes que deixavam evidências no local do crime, que "ninguém perde por apostar na estupidez humana no curto prazo; mas no longo prazo todo mundo sai perdendo".
Uma política de comunicação baseada em platitudes e meias verdades é uma aposta na boçalidade.
As escolhas da imprensa, em sua cruzada partidária, não contribuem para estimular a consciência cívica porque não se trata mais de jornalismo, mas de campanha política.
Portanto, Geraldo Alckmin faz tecnicamente a coisa certa e Dilma Rousseff combate moinhos de vento.