Como jornalista atuante em áreas que vão de Direitos Humanos a Tecnologia, e com uma pós-graduação em Gestão da Comunicação em Mídias Digitais, tenho observado de perto as transformações pelas quais nosso campo tem passado, especialmente com a ascensão das redes sociais.
As redes sociais se tornaram não apenas ferramentas para jornalistas garimparem fontes e pautas, mas também espaços onde encontramos material bruto, em forma de declarações, vídeos e imagens com teor informativo, isso é fato. Figuras públicas, como políticos, artistas, esportistas e celebridades de vários ramos usam as redes sociais para publicar comentários, divulgar notas oficiais e responder a questionamentos, alcançando diretamente os seus seguidores digitais, sem a intermediação de um profissional de jornalismo (repórter).
Este material, com valor jornalístico, é frequentemente reproduzido em notícias. Uma limitação é que, diferentemente do que ocorre em entrevistas, este procedimento impede que repórteres questionem aspectos e detalhes do que está sendo dito ou divulgado. Perde-se a chance de ir além do discurso oficial e, com isso, aumenta a possibilidade de a notícia ser incompleta. Mas hoje em dia este é o menor dos problemas.
As redes sociais também são muito utilizadas por este universo de figuras públicas para questionamentos que vão além do esclarecimento e enveredam pela polêmica — desabafos, respostas a “rivais”, ataques a “inimigos”, críticas duras a concorrentes etc.
Para os fãs, não muda nada. Eles recebem estes comentários diretamente, sem intermediários, e fazem o uso que bem entendem deles — afagos digitais, curtidas, compartilhamentos e ataques e, pasmem, até mesmo ameaças.
Mais complicado é o uso que nós jornalistas fazemos deste tipo de material. Como o comentário foi tornado público no Facebook, Twitter, Instagram e até mesmo no LinkedIn, entendemos que ele precisa ser reproduzido rapidamente, antes que algum concorrente nosso faça o mesmo.
E quando fazemos isso, nos arriscamos a cometer erros e causar problemas. Vejo com certa frequência textos publicados destacando a informação de que serão atualizados assim que o “outro lado” se manifestar. Eu mesmo já fiz isso. Ora, se o texto depende da versão de um “outro lado”, é porque envolve algum tipo de acusação ou necessita de um contraponto. Logo, tem mais de uma versão.
Ao publicar uma acusação sem o “outro lado”, o dano, em caso de erro, é irreparável. É óbvio que, se o presidente Milei entra no Twitter e ofende a primeira-ministra da Espanha, a notícia deve ser publicada imediatamente, sem esperar a resposta de Pedro Sánchez.
Mas arrisco dizer que 95% das informações que nós jornalistas captamos nas redes sociais e transformamos em notícias não têm essa urgência. Dá, sim, tempo de esperar o tal “outro lado” se manifestar sobre. “Ah, mas o concorrente publicou sem ouvir o outro lado”, alguém dirá. Paciência. É ele, e não você, que ficará com a fama de irresponsável, ou com culpa por causar dano a alguém.
Com minha experiência como jornalista em São Paulo, atuando em campos diversos e enfrentando os desafios de um mundo cada vez mais digitalizado, sinto-me na obrigação de estimular a reflexão sobre a prática jornalística na atualidade. Nestes tempos marcados pela instantaneidade e fragmentação das informações, destaco a importância da ética jornalística. É fundamental valorizar a qualidade e a responsabilidade na produção jornalística.
Deixo aqui um convite aos profissionais de imprensa a repensarem suas práticas e buscarem um jornalismo ético, seguindo os preceitos da verdade e interesse público.
Espero aqui ter contribuído para galgarmos um debate essencial para a preservação da credibilidade e relevância de nossa profissão. Afinal, somos guardiões da verdade e devemos exercer nosso papel com o máximo de responsabilidade e integridade.
Texto originalmente publicado em edmundojornalista.medium.com
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Edmundo Paschoal é jornalista freelancer, pós-graduado em gestão da comunicação em mídias digitais no Centro Universitário Senac. Atuou como redator no Latin American Quality Institute, organização vinculada à ONU, no International Center for Journalists (ICFJ) e na Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji).