Aqui em Coral Gables, na Florida (EUA), o 13º International Public Relations Research Conference reúne professores de comunicação organizacional e relações públicas de todo o mundo, sobretudo dos EUA, Canadá, Europa e Ásia. A presença brasileira é ainda muito pequena, embora nossos pesquisadores aumentem gradativamente a participação em encontros acadêmicos internacionais e coloquem na mesa de debate global temas e particularidades das nossas relações públicas e da comunicação organizacional. Na medida em que as empresas e instituições brasileiras avançam e conquistam presença internacional, que implica em se movimentar bem em ambiente intercultural, cheio de obstáculos políticos, econômicos e controvérsias, isso é muito bom.
O tema principal da Conferência deste ano gira em torno das questões éticas, que envolvem os relacionamentos e a comunicação de empresas e instituições. São dezenas de apresentações, mas se destacam as pesquisas sobre o impacto das mídias sociais digitais na vida das empresas e da sociedade; o gerenciamento dos relacionamentos nas crises, como a do sistema financeiro internacional, em 2009, e a do sistema de saúde norte-americano, que é apelidada aqui de Obamacare.
Empresário alternativo
Um dos casos analisados foi apresentado pelos professores John Wirtz e Austin Sims, da Texas Tech University, que relata as consequências vividas, no segundo semestre de 2009, pela Whole Foods Market, cadeia norte-americana de supermercados, especializada em alimentos naturais e orgânicos, depois que seu presidente, John Mackey, emitiu opinião contrária às mudanças do sistema norte-americano de saúde, pretendidas pelo governo Obama.
Em 11 de agosto de 2009, Mackey publicou no The Wall Street Journal o artigo ‘The Whole Foods Alternative to Obamacare’, no qual afirma que o sistema de saúde pretendido por Obama era a última coisa que o país precisava, que geraria mais um déficit bilionário, e que os EUA precisavam de menos controle governamental e mais empreendedorismo individual. Deu como bom exemplo a política de benefícios da Whole Foods para seus empregados. E conclui o artigo com uma declaração pela responsabilidade individual: ‘Nós todos somos responsáveis pelas nossas próprias vidas e saúdes… E devemos usar nossa liberdade para escolher estilos de vida que protegerão nossa saúde’.
Mackey é modelo de empresário alternativo, natureba bilionário, ligado a causas de sustentabilidade e responsabilidade social, a imagem do Whole Foods Market está colada ao ideário desses temas e grande parte de seus consumidores se identifica com políticas sociais e verdes.
Boas perguntas
Quando essas declarações repercutiram pelas redes sociais, criou-se a polêmica com parte de sua base de consumidores, com integrantes do governo, com organizações não-governamentais e com a mídia social, engajada no debate sobre as mudanças no sistema de saúde pretendidas por Obama. O Whole Foods foi atingido por boicotes organizados por consumidores e a comunicação da empresa foi desqualificada com acusações de mal ambiente de trabalho. Os pesquisadores da Texas Tech University reafirmaram uma máxima ensinada por nossos avôs: política não se mistura com negócio; o resultado é quase sempre danoso para a imagem das empresas e para os empresários.
Mas como os empresários podem participar do debate nacional? Quais são as formas competentes, legais e legítimas desse tipo de participação?
São boas perguntas e o caso John Mackey, além de algum interesse para os comunicadores brasileiros, pode principiar essa reflexão. Afinal, toda a sociedade brasileira deve pensar sobre o assunto, especialmente neste ano, em que o Brasil elege um novo presidente, seus governadores, senadores e deputados.
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Jornalista, professor da ECA-USP e diretor-geral da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje)