Monday, 28 de October de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1311

Em um mundo mais seco, jornalismo deve ser terra fértil para compartilhamento de soluções

( Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil)

As mudanças climáticas são assunto incontornável por conta de seus efeitos, como a ocorrência de secas, tempestades e inundações com maior intensidade e frequência. Consequências de eventos climáticos extremos se sucedem nos noticiários, do furacão Milton, na América do Norte, ao temporal que afetou milhões de paulistanos na última semana.

Apesar da maior intensidade e frequência também na presença dos temas ambientais na pauta do dia, a sucessão de novos acontecimentos pode soterrar a cobertura sobre os desdobramentos desses fenômenos. Nesta semana, por exemplo, a seca histórica na Amazônia ressurgiu como pauta no Jornal Nacional, o principal telejornal do Brasil, após o foco nos temas citados anteriormente.

A reportagem em questão, exibida na segunda (14), falou sobre os desafios logísticos trazidos pelo baixo nível dos rios em Manaus. O enfoque foi econômico, mostrando como a dificuldade de navegação e de acesso dos navios aos portos da região encarece até mesmo produtos típicos, como o tucumã.

Sabemos que não é possível contemplar todas as consequências da seca em uma reportagem de dois minutos, e em meio a um noticiário já tão sobrecarregado. Porém, ressaltamos que é preciso dar continuidade a essa cobertura a partir de outros recortes, visto que o jornalismo ambiental preza pela contextualização dos fenômenos, o que viabiliza inclusive a proposição de soluções.

Outras abordagens sobre a mesma problemática podem ser vistas em reportagens como a de Luis Felipe Azevedo e Lucas Altino, de O Globo, que aborda a dificuldade de caminhões cruzarem o rio Madeira em balsas, no Amazonas, visto que a diminuição do nível do rio torna a navegação mais perigosa. Ou ainda na reportagem de Nicoly Ambrosio, em Amazônia Real, que detalha os impactos da seca na qualidade de vida dos manauaras, que já passaram meses sujeitos à fumaça das queimadas.

A seca impacta o abastecimento de água, a alimentação das pessoas, a sobrevivência de outras espécies, como os botos. Em suma, fragiliza a resiliência do bioma. Com a quebra de recordes ano a ano, precisamos assumir o princípio da precaução também no jornalismo.

Precisamos de reportagens que não somente mostrem as consequências hoje, mas que cobrem setor público e privado e que se orientem pelo que diz a ciência a fim de evitar danos tão profundos nos anos por vir. É necessário lembrar ao público de que é possível reverter o caminho destrutivo da humanidade, e a conscientização é fundamental para fortalecer a cobrança coletiva dos principais responsáveis pela crise climática.

Texto publicado originalmente em Observatório Ambiental.

***

Débora Gallas é Jornalista, doutora em Comunicação e Informação, integrante do Grupo de Pesquisa Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS). E-mail: deborasteigleder@gmail.com.