Friday, 08 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1313

A crise climática na cobertura jornalística das catástrofes em Valência e Porto Alegre

(Imagem: Joel/Pixabay)

“Devastadora”, “trágica”, “catastrófica” e “apocalíptica” são adjetivos que a imprensa espanhola está usando para se referir aos efeitos da já caracterizada “maior chuva do século”, que devastou principalmente a comunidade de Valência. A imprensa brasileira também tem se utilizado dos mesmos adjetivos na cobertura. Postagens nas redes sociais estão divulgando notícias vindas do país europeu e associando o fato com as enchentes de abril/maio no Rio Grande do Sul. É oportuno, portanto, analisar a cobertura jornalística espanhola para investigar como estão posicionados os debates sobre a crise climática e a relação com a violenta DANA (depressão isolada de alto nível), fenômeno provocador das violentas chuvas e que ocorre quando o ar frio desce sobre as águas quentes do Mar Mediterrâneo.

Às 18h45 desta quarta-feira (30), o jornal El Mundo o assunto na capa, enquanto no El País, cujo slogan é “El periódico global”, as notícias mais bem posicionadas tem relação com a eleição presidencial nos Estados Unidos. No El País, a matéria principal, intitulada “95 muertos y decenas de desaparecidos en la peor gota fría del siglo en España”, destaca o mesmo fato do El Mundo, o número já confirmado de mortos: “Al menos 95 muertos y decenas de desaparecidos por la DANA”.

O El Mundo traz como primeira retranca outro fato que certamente irá merecer farta cobertura nos próximos dias: a demora do acionamento do sistema de alerta de Valência. O jornal também dá destaque para os motivos pelos quais a DANA foi tão violenta. A notícia traz análises de meteorologistas e destaca-se o seguinte trecho: “En este episodio, ha influido también un factor muy vinculado al cambio climático: la temperatura del agua del mar, pues en la costa de Valencia estaba entre un grado y dos por encima de la media en esta época del año. ‘No es una anomalía tan significativa como la de otros momentos del año, pero sin duda ha contribuido a que haya habido más lluvia’, afirma.”

O El País aborda o fato em uma retranca de dois parágrafos na qual afirma que o Mediterrâneo mais quente que o normal, para esta época do ano, é a chave para a virulência das chuvas.

Em nota, a Metsul Meteorologia analisou dados da chuva na comunidade espanhola de Valência, comparou-os aos do desastre no Rio Grande do Sul e concluiu que a precipitação em pontos de Valência superou o acumulado em 24 horas de qualquer cidade gaúcha no evento do fim de abril e o começo de maio. Mas, segundo a nota, “se considerado o período prolongado de instabilidade que atingiu o Rio Grande do Sul os volumes foram parecidos ou o dobro do que choveu em um só dia na região mais castigada da Espanha”

Os dois veículos trazem reportagens descritivas sobre os impactos da DANA em diferentes localidades, medidas imediatas das autoridades públicas, serviços disponíveis aos atingidos, previsão meteorológica para as próximas horas e postagens de redes sociais feitas por moradores. Do ponto de vista da crítica da cobertura jornalística, seriam de grande valia estudos mais aprofundados para comparar o trabalho desenvolvido pelos jornais e jornalistas espanhóis com o dos congêneres do Rio Grande do Sul, a partir das premissas do jornalismo ambiental.

Texto publicado originalmente em Observatório de Jornalismo Ambiental.

***

Míriam Santini de Abreu é Jornalista, doutora em Jornalismo, mestre em Geografia e especialista em Educação e Meio Ambiente.