O deputado Roberto Jefferson derrubou o ministro José Dirceu – que já estava sai-não sai ou cai-não cai, como se queira, mas isso virou detalhe. Derrubou também três diretores de Furnas. A Veja deve derrubar terça-feira (para quando foi adiada a reunião do PT que se realizaria hoje) o tesoureiro Delúbio Soares, o secretário Sílvio Pereira e, se perigar, também o presidente do partido, José Genoino.
A forma glacialmente sumária com que o presidente Lula apertou a mão de Genoino ontem cedo na abertura de um seminário de partidos latino-americanos de esquerda é uma das tais imagens que valem por não sei quantas palavras. Na mídia, salvo engano, só o Jornal Nacional chamou a atenção para o fato.
Lula vinha pedindo a Genoino a cabeça do duo Delúbio-Silvinho desde que a palavra mensalão caiu na boca do povo. Mas, por uma questão de justiça com o companheiro e de honestidade consigo mesmo, Lula devia se lembrar que, em fevereiro do ano passado, quando irrompeu o caso Waldomiro, também ele fingiu que não ouviu os conselhos para que tirasse Dirceu do Planalto.
Se arrependimento matasse, o presidente estaria repousando na mais florida alameda do Jardim do Éden, à esquerda de quem entra.
A situação de Genoino é de doer. Lula está de mal com ele. A ala ortodoxa do partido quer vê-lo “sambar”, para citar o presidente. E, ou o velho guerreiro é um farsante – no que não acredito, salvo prova provada em contrário –, ou ficou claro ontem que Delúbio o apunhalou pelas costas.
Delúbio fez Genoino dizer que à Veja na sexta-feira que o publicitário mineiro Marcos Valério não avalizou nenhum empréstimo bancário do PT. Mas a revista demonstrou, preto no branco, que um mês depois da posse de Lula não só Valério, mas também Delúbio e Genoino avalizaram o empréstimo de R$ 2,4 milhões do Banco de Minas Gerais (BMG) para a legenda, intermediado pelo atilado Valério, que não dá ponto sem nó.
Confrontado pelos fatos, Genoino foi obrigado a se desmentir – o que, nesta altura do campeonato tem tudo para ser letal. Depois, levou Delúbio pelo pescoço a assinar uma nota que recende a falsidade, em que diz ter transmitido ao presidente do PT “uma informação incompleta e, portanto, equivocada”.
A falsidade está na passagem em que o amigo do peito do homem da mala dá a entender que se esqueceu do empréstimo do BMG (do qual o valioso Valério pagou uma prestação de R$ 350 mil menos uns trocados), quando perguntado por Genoino. O distraído Delúbio diz que se ateve “às operações celebradas (celebradas é uma boa palavra, no caso) com o Banco Rural, mencionadas nas últimas semanas”.
Para quem acabou de chegar de Marte, era do Banco Rural, em Minas e Brasília, que Valério tirava o grosso da bufunfa pulsante com a qual, segundo Jefferson, comprava a fidelidade ao governo da gente fina da base aliada na Câmara.
Se mentir fosse jogar tênis, Valério e Delúbio dificilmente seriam derrotados em um torneio internacional de duplas masculinas.
Por respeito ao seu passado e simpatia por essa grande figura humana que é José Genoino, torço para que, na pior das hipóteses, ele saia do que houver de verdade em toda essa história sórdida como o penúltimo a saber – sendo o último, para o bem da estabilidade política do país, o presidente Lula.
Mas não apostaria nisso o meu último centavo.
O xis da questão: como o PT recompensou Valério
O problema não é nem o mensalão, sobre o que há mais dúvidas do que certezas: afinal, nos casos até aqui denunciados só aparecem as digitais de políticos do PL e do PP.
Não são nem os R$ 20 milhões que, segundo Jefferson, Genoino lhe teria prometido para os candidatos a prefeito do PTB nas eleições do ano passado. É a palavra de um (e do também deputado petebista José Múcio Monteiro) contra a do outro.
O problema é a eventual participação direta da cúpula do PT no esquema de retribuição dos inestimáveis serviços prestados pelo diligente Valério. Sob a forma de negócios maceteados com o setor público e outros, turbinados pelos primeiros, graças aos quais o patrimônio do homem saltou de R$ 6,7 milhões em 2003 para R$ 14 milhões em 2004 – depois de crescer de R$ 230 mil em 1997 para R$ 3,8 milhões em 2002.
Se isso ficar comprovado, adeus Dirceu, adeus Genoino, adeus o novo PT – e, quem sabe, adeus reeleição.
A mídia, que já sentiu o gosto de sangue, não vai parar mais.
P.S. Enquanto prepara a sua defesa perante, entre outros foros maiores, a cpi (comissão petista de inquérito) que nenhuma força humana conseguirá abafar, o professor Delúbio devia separar 10 minutos para ler o artigo de hoje do ex-presidente Fernando Henrique, no Estado e no Globo. Não é o manifesto golpista das fantasias delubianas. É o oposto: a mão estendida para a mão estendida que Lula ofereceu dias atrás ao governador tucano Aécio Neves.