Sem favor nenhum – e torcendo para que o futuro não desminta o julgamento – as duas melhores decisões que o presidente Lula tomou na escalação da equipe para o seu segundo mandato foram a de manter o professor Fernando Haddad no Ministério da Educação e a de convidar o jornalista Franklin Martins para dirigir a Secretaria de Comunicação Social do governo, com status ministerial.
No caso de Franklin, a cada entrevista ele sedimenta a percepção inicial dos observadores entre os quais me incluo de que é a pessoa certa no lugar certo, mais do que qualquer de seus antecessores até onde a memória alcança.
Não apenas pelas suas idéias dificilmente contestáveis sobre as relações entre poder público, comunicação jornalística e publicitária do Estado, imprensa e sociedade. Mas também, quem sabe principalmente, por sua visão desembaçada do que une a grande maioria dos brasileiros – o consenso que o país construiu quase sem se dar conta.
Em outras palavras, Franklin pensa bem e pensa grande, como prova a entrevista que ele deu ao repórter João Domingos, do Estado, e cujos principais trechos são estes:
”Defendo que agências que participaram da campanha de um candidato que tenha vencido a eleição não tenham conta do governo federal. Asseguro que do governo a vencedora não terá nenhuma conta. Acho que esse critério deveria ser adotado por todos os Estados. Uma forma de aparelhar o Estado é usar uma agência para fazer sua campanha e depois lhe passar contas do governo. Isso tem que acabar. [As empresas estatais] também deveriam seguir o critério de não entregar contas de publicidade às agências do vencedor. Jornais terão participação [nas verbas publicitárias] compatível com sua circulação, e as TVs, com sua audiência. Não cabe ao governo regar ou plantar jornais favoráveis nem criar problema para ninguém.
Passamos por uma crise política brutal, momentos de absoluta selvageria. O governo reagiu à crise – no mandato anterior – se colocando em posição defensiva. E boa parte dos órgãos de imprensa partiu para uma posição muito agressiva. Falavam, escreviam o que queriam, o que é próprio da democracia, da liberdade de imprensa, mas muitas vezes não correspondia a fatos. Todos foram julgados pela sociedade. A lição que o governo tirou é de que deve ter relação mais profissional e mais tranqüila com a imprensa. Acho que a imprensa está tirando também lições. Procura ter postura menos agressiva, voltando àquele velho e bom jornalismo, de se apoiar nos fatos e não em opiniões ou preconceitos. E está fazendo isso porque a sociedade está pedindo.
O que se quer é implantar uma rede nacional de TV pública. É diferente da comercial, que produz conteúdo para atrair audiência e vender publicidade. E é diferente da estatal, em que a programação é basicamente de comunicação de governo. A lógica da TV pública é fazer programação de qualidade, com controle social e público. É uma TV pública, não de governo, é plural, não partidária, aberta à diversidade. A programação é de caráter cultural, educativo, com jornalismo isento. Procura abrigar as diferenças culturais e regionais do País. É aberta à produção independente. A idéia do governo é, partindo das estruturas de que dispõe – Radiobrás e TVs Educativas do Rio e do Maranhão -, constituir a espinha dorsal dessa rede. Pode-se construir um modelo em que só participarão da rede as que evoluam para um modelo de gestão pública. Se for um modelo em que o palácio do governador manda na emissora, na cobertura, e não tem nenhum tipo de controle público, não fará parte dessa rede. Do meu ponto de vista, não dá para ter uma TV que em parte é comercial, em parte pública, em parte estatal.
Nós temos uma agenda comum, de todas as correntes políticas, que é uma das maiores conquistas da democracia, algo que construímos quase sem perceber. E que poderíamos ter perdido na recente crise sem perceber que a tínhamos construído. Em primeiro lugar, a democracia: queremos resolver nossos problemas pela via democrática. Quem ganhou eleição leva, quem tem menos voto vai para a oposição, os direitos da minoria devem ser respeitados, os direitos e garantias individuais devem ser respeitados. Segundo: devemos ter moeda, porque aquela fórmula mágica de driblar a inflação se revelou um desastre para o País. Terceiro: queremos ter responsabilidade fiscal. Quarto: queremos voltar a crescer. E, quinto, não basta só crescer. É preciso distribuir renda, diminuir desigualdade. Esses pontos hoje são aceitos por 70%, 80% das forças políticas. Eles têm espaços para as divergências, mas balizam a luta política. Se nós mantivermos isso aí, a luta política será muito mais eficiente do que a maluquice de cada um disparando para um lado, desqualificando o outro.
É um luxo.
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