Quatro anos atrás, a soja enchia de dólares os bolsos dos agricultores brasileiros, enquanto o agronegócio, louvado e festejado como a nova excelência brasileira, ganhava as capas das grandes revistas nacionais, as manchetes dos jornais e até espaço no Jornal Nacional.
Mas a agricultura é cíclica. Os estoques mundiais cresceram, os preços caíram e com uma taxa de câmbio desfavorável, a soja afundou na pior crise de sua história. A rentabilidade da oleaginosa, que em 2004 chegou a mais de 20%, virou pó. A perda de renda dos sojicultores nas últimas duas safras alcança R$ 27 bilhões e derruba a economia das cidades do Centro-Oeste do Brasil, onde o Brasil produz 60% de sua safra de soja. A crise está nos jornais, é verdade, mas nas páginas internas. Outrora competente, o agronegócio, principalmente a soja, voltou a ser sinônimo de atraso, calote, dívida.
Costuma-se dizer no interior que cavalo selado não passa duas vezes. Oportunidades não faltam para o agronegócio brasileiro, mas para sair a galope no mercado internacional antes de tudo é preciso competência. Cavalo bom e sela segura. Tanto a iniciativa privada como o governo devem traçar estratégias capazes de promover o desenvolvimento sustentável do agronegócio.
Tecnologia não nos falta. Basta ver o que ocorreu no cerrado brasileiro, que hoje serve de modelo de produção agrícola tropical. Durante o Workshop Internacional sobre Agricultura Tropical, que se realiza esta semana em Brasília, o pesquisador Edson Lobato descreveu como as tecnologias desenvolvidas pelos cientistas brasileiros, como a correção da acidez do solo, adubação fosfotada e o plantio direto, domaram as terras de baixa produtividade dos cerrados e permitiram a conquista do Brasil Central.
‘O uso sustentável da terra e o investimento em técnicas adequadas podem proporcionar o plantio, em mais 60 milhões de hectares, de um total de 204 milhões de hectares do Cerrado. Até agora temos 139 milhões de hectares cultiváveis, há 60 milhões de hectares em estoque e outros 32 milhões de hectares na reserva’, disse Lobato.
Em 1975, segundo o pesquisador, os sojicultores de Rondonópolis, em Mato Grosso, colhiam em média 25 sacas por hectare, a um custo de produção de 21 sacas/hectare. A renda líquida era de apenas 4 sacas/hectare. A partir de 1990, a produtividade saltou para 54 sacas/hectare. Com custo de 45 sacas/hectare, o produtor conseguia um retorno de 9/sacas/hectare.
Além de responsável por 60% da soja colhida no Brasil, os cerrados produzem 59 do café brasileiro, 45% do feijão, 44% do milho, 81% do sorgo, 55% da carne bovina e 10% da cana-de-açúcar. Os cerrados são o terceiro maior produtor de grãos do país e abrigam cerca de 40% do rebanho bovino brasileiro.
Mas, com uma extraordinária biodiversidade, os cerrados não podem ser encarados apenas como fronteira agrícola. Eles são a segunda maior formação vegetal do país, atrás apenas da Floresta Amazônica, e ocupam 2 milhões de km2 (área equivalente a 23% do território nacional) espalhados por 10 Estados. Apenas 20% dessa área ainda mantêm intacta sua vegetação nativa. É possível aumentar a produção de grãos e de carnes na região, preservando ao mesmo tempo a sua natureza exuberante.
A região reúne 10 mil espécies de plantas diferentes (muitas delas de uso medicinal e alimentício), 759 espécies de aves de reproduzem por lá, além de 180 espécies de répteis e 195 de mamíferos, sem contar com o surpreendente número de insetos, como cupins, borboletas, abelhas e vespas.
O grande desafio é desenvolver uma agropecuária sustentável nos cerrados, capaz de gerar renda, criar empregos e também preservar sua biodiversidade.