Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Revolta do Cairo invade imprensa estatal árabe

Órgãos oficiais de imprensa dos regimes do mundo árabe não conseguiram ignorar a queda do ditador egípcio, Hosni Mubarak. Até mesmo a agência de notícias Sana, da Síria, sempre relutante em publicar qualquer notícia que não seja de interesse do governo de Bashar Assad, dava enorme destaque para os eventos no Cairo. A Jordânia, do rei Abdullah II, também publicava manchetes em seus sites para a renúncia do presidente egípcio. O mesmo era observado nos jornais do Iêmen e do Marrocos. Em quase todos esses países, a rede de TV Al-Jazira está presente, exibindo imagens dos levantes no Cairo.

‘Mubarak renuncia e entrega os poderes para as Forças Armadas’, dizia a agência de notícias síria. O Jordan Times, publicado em inglês e árabe na Jordânia, trazia uma enorme bandeira do Egito em meio à multidão na capa de sua edição na internet. Ironicamente, nas últimas semanas Amã foi alvo de protestos que pediam a redução dos poderes do rei. Temendo ter o mesmo destino de Zine El Abidine Ben Ali, da Tunísia, e de Mubarak, os governantes da região começaram a implementar reformas e buscam não cometer os mesmos equívocos. Assad, na Síria, decidiu acabar com o bloqueio do Facebook, Twitter e YouTube. Na prática, trata-se de uma estratégia de relações públicas, já que, em cibercafés espalhados por cidades como Damasco e Alepo, muitos sírios já utilizavam normalmente esses sites por meio de proxies.

Especial apreensão em Israel

As reformas políticas também têm ocorrido na região, como as promessas do presidente Ali Abdullah Saleh, do Iêmen, dizendo que não concorrerá a novas eleições, em 2013. O rei da Jordânia removeu seu premiê. A Arábia Saudita era um dos regimes que mais pressionavam pela manutenção do status quo. Nas últimas semanas, a monarquia dos Saud, juntamente com o governo israelense, agiu em Washington para tentar convencer a administração de Barack Obama sobre os riscos para toda a região caso Mubarak caísse. Mas ontem (12/2) especialistas diziam que os sauditas passaram a ver a queda de Mubarak como um incentivo para os iranianos derrubarem o regime xiita, rival dos sunitas de Riad – a monarquia saudita não corre risco de cair por ter uma população ainda mais conservadora do que os governantes.

O ativista sírio Aloosh Devrim, que tenta organizar a oposição em seu país, notava ontem as diferenças entre a Síria e o Egito. ‘O exército egípcio sempre foi visto como uma força neutra, enquanto o sírio não pensaria duas vezes em agir contra a população.’

A lenta queda de Mubarak foi vista com especial apreensão por Israel. O Egito foi o primeiro país árabe a reconhecer o Estado judeu e a firmar um acordo de paz com Tel-Aviv, em 1979. Ontem, a regra no gabinete israelense era manter o completo silêncio sobre os acontecimentos no Cairo. Mas ex-funcionários de alto escalão alertaram para os riscos da transição para Israel.

‘Temos um duro período pela frente’, disse Zvi Mazel, ex-embaixador de Israel no Cairo, em entrevista a uma emissora local. ‘O Irã e a Turquia consolidarão seu poder contra nós. É preciso esquecer o antigo Egito. Agora é uma realidade completamente diferente – e ela não será fácil.’ Binyamin Ben-Eliezer, ex-ministro da Defesa e amigo pessoal de Mubarak, dava como certo o rompimento do tratado de paz entre os dois países. ‘Agora, só temos perguntas.’ (Com a agência Associated Press)

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Jornalista