Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O “jornalismo aberto”
do Guardian

 

Por Tiago Dória # reproduzido do blog do autor, 5/3/2012; título original “O Guardian não é o Guardian à toa”

Depois de um hiato de mais de 25 anos, o Guardian lançou, na semana passada, um comercial (Três Porquinhos) sobre o jornalismo atualmente praticado pela publicação.

O anúncio dividiu opiniões. Para quem está acostumado com a dinâmica das publicações com o DNA 100% digital, realmente o vídeo não traz novidades – participação dos leitores, jornalismo distribuído multimídia e em tempo real. Contudo, para uma publicação que até outro dia tratava jornal como um produto final e não um processo, o comercial tem um grande impacto histórico.

O Guardian tem uma posição singular. Apesar da crescente receita com publicidade online e da ideia de “jornalismo aberto”, o jornal ainda perde dinheiro. Até hoje é mantido pelo elevado retorno dos outros negócios do grupo do qual faz parte – o Guardian Media Group.

Nenhuma raridade até aí. Diversos grupos adotam o mesmo modelo de negócios – utilizar os lucros gerados em negócios estabelecidos para sustentar outros inovadores e arriscados.

Isso, aliás, está na cultura do Guardian. C. P. Scott, proprietário do jornal no início do século 20, dizia que era mais importante ser influente do que obter lucro.

A missão do Guardian nunca foi a rentabilidade, mas espalhar a “visão liberal” pelo mundo. Nos valores e objetivos da empresa, a palavra rentabilidade não tem vez ou prioridade.

Naturalmente, essa situação dá ao Guardian um grande e cômodo espaço para inovar, experimentar e correr riscos. O que, é claro, não tira a importância nem o mérito do que o jornal está fazendo.

NYTimes e USAToday vêm tentando copiá-lo. O primeiro com resultados que têm elevado a satisfação dos leitores.

Outra questão importante – na década passada, o Guardian passou a tratar a área de TI como estratégica. Deixou de ser uma área simplesmente de apoio e operacional para se tornar essencial. Mudança que foi imprescindível para o que viria pela frente.

Ao contrário do que os grupos de mídia tradicionalmente fazem, liberar o acesso à base de dados, utilizar plataformas de redes sociais e incentivar a participação do leitor não foram pontos de partida e ações isoladas, mas consequências de uma estratégia que não começou de uma hora para outra.

Com a nova campanha publicitária do jornal, o Guardian Media Group reforça o seu papel histórico de ser um exemplo de como um grupo de mídia pode utilizar a “vaca leiteira” para inovar em outras áreas. E de que grandes empresas podem e devem abraçar a inovação.

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[Tiago Dória é colunista do iG]