Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Fotos do Haiti: realismo ou sensacionalismo?

Pela magnitude da devastação provocada pelo terremoto que destruiu a capital do Haiti, leitores do Washington Post esperavam a publicação de imagens fortes. Ainda assim, muitos não estavam preparados para as fotos que retratavam as milhares de mortes no país, escreveu o ombudsman Andrew Alexander, em sua coluna de domingo [24/1/10].

Uma das imagens estampadas no jornal mostrava um corpo carbonizado; outra, um cadáver sendo jogado como lixo em um caminhão. ‘Teria sido mais positivo ver uma criança ferida recebendo ajuda’, opinou a leitora Ruth Hartmann. A leitora Chris Powers concordou. ‘Não tenho problemas com realismo no fotojornalismo. Mas não gosto de sensacionalismo, em especial na primeira página, que não me dá outra opção além de olhar’.

Organizações de mídia sempre debateram o limite da exposição da morte em imagens. ‘No Haiti, onde o número de vítimas era crescente, mostrar a situação do país sem fotos de corpos seria impossível. Mas há uma questão de bom gosto e decência’, diz Terry Eiler, diretor da Escola de Comunicação Visual da Universidade de Ohio.

A repórter fotógrafica Carol Guzy, que trabalha para o Post e foi autora da maioria das imagens consideradas chocantes publicadas pelos jornal, tem familiaridade com o Haiti. Jornalista veterana, Carol recebeu um de seus três prêmios Pulitzer pela cobertura do conflito civil no país, em 1995. ‘A tragédia foi tão profunda que não nos permite não publicar as imagens mais fortes. Mas não as escolhemos apenas com base no quão chocantes são’, explicou o editor de fotografia do Post Michel du Cille.

O processo de selecionar fotos delicadas para o jornal começa com uma reunião entre os principais editores. No caso de uma foto publicada na capa da edição do dia 15 de janeiro, que mostrava um homem agachado sob os escombros passando ao lado de uma menina morta, os editores concordaram que a imagem tinha de ganhar destaque. ‘A imagem do homem em meio ao caos deu um sentido de que a vida estava além da tragédia’, avaliou a editora Bonnie Jo Mount.

Aviso de alerta

O site do Post exibiu centenas de imagens de Carol, da fotógrafa Nikki Kahn e de agências. Muitas eram impactantes, mostrando corpos empilhados ou ao longo das ruas. No site, todas eram precedidas por um grande aviso de alerta, que indicava que ‘algumas imagens podem ser inquietantes’. Muitos leitores que reclamaram com o Post alegaram, no entanto, que a grande maioria das fotos impactantes estava na capa do jornal, onde não havia nenhum alerta.

A indústria jornalística ainda não adotou regras universais sobre o uso de imagens deste tipo. Algumas empresas usam o que o diretor Terry Eiler chama de ‘teste do cereal’: ‘como os leitores, especialmente os que estão com filhos pequenos quando leem o jornal, vão reagir na mesa do café da manhã?’.

Muitos jornais, em geral, não publicam fotos de corpos de bebês. Outros evitam colocar fotos explícitas por temer que leitores possam ter ligação com os mortos. No caso do Haiti, a ‘distância permite que alguns acreditem que tudo está acontecendo longe de nós’, opina Eiler. No final das contas, a decisão de publicar ou não as imagens, diz o ombudsman, é subjetiva.