Voltada, como não poderia deixar de ser, para o julgamento preliminar do mensalão, que ocupa a parte do leão dos cadernos nacionais, a imprensa tem informado muito menos do que conviria ao interesse público quem é o juiz que o presidente Lula vai indicar para o Supremo Tribunal Federal, na vaga aberta com a aposentadoria antecipada do ministro Sepúlveda Pertence.
Pelos jornais fica-se sabendo principalmente que o juiz se chama Direito – Carlos Alberto Menezes Direito -, que é membro do Superior Tribunal de Justiça e que foi apadrinhado por uma penca de poderosos.
A começar do ministro da Defesa Nelson Jobim e do ex-presidente do Senado José Sarney. Além de outros políticos do PMDB, ao qual Direito é ligado, e do ex-PFL.
No governo, o principal foco de resistência a Direito é capitaneado peloministro da Justiça, Tarso Genro.
Fica-se sabendo também pelos diários que a nomeação envolve uma corrida contra o relógio. Magistrados não podem chegar ao Supremo depois dos 65 anos. Direito fará 65 no próximo dia 8.
A sua indicação precisa ser aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça e pelo plenário do Senado. O que deixa o exíguo prazo de nove dias corridos ou sete úteis – há um fim de semana no caminho e depois o 7 de Setembro.
Dará tempo? Não dará tempo? A Folha, ouvindo suas fontes, parece achar que sim. O Valor, ouvindo as dele, parece achar que não – com a vantagem, para o leitor, de identificar os céticos. “Votação relâmpago não acontecerá”, prevê o senador tucano Sérgio Guerra.
Mas, como dizem as crianças circulando pelo zoológico, “e o hipopótamo?”
O “hipopótamo”, com todo o respeito, é o ideário do doutor Direito, a que a mídia tem dedicado escasso espaço.
A matéria do Valor de hoje, por exemplo, é rica em informações sobre o minueto político – ou será o rally político? – em torno da nomeação. Mas nada sobre as convicções pessoais do togado, nem sobre a influência delas nos seus veredictos.
O Globo se limita a dizer que, indicando o seu nome, “Lula agradaria à Igreja Católica. Direito é contra o aborto e se alinha ao clero conservador em temas sobre comportamento da sociedade.’
A Folha vai um pouco adiante, ao informar: “Ele é ligado à area mais tradicional da Igreja Católica, contra a interrupção da gravidez mesmo em caso de anencefalia do feto e pesquisas com células-tronco.
Só isso deixa claro que, se chegar lá, Direito estará para o nosso Supremo Tribunal Federal como estão para a Suprema Corte americana os baluartes da direita religiosa, nomeados, de caso pensadíssimo, pelo presidente Bush.
Mas a opinião pública e o Senado da República precisam saber mais sobre a conduta do doutor – os votos que ele proferiu em matérias controversas ao longo da carreira.
Assim como já acontece na América, também no Brasil a mais alta corte de Justiça tenderá com frequência cada vez maior a se pronunciar sobre a constitucionalidade de atos legislativos sobre aspectos da chamada “agenda pós-materialista” – assuntos que mexem com liberdades individuais e a possibilidade de fazer ciência sem as restrições que lhes querem impôr as religiões.
De intolerantes religiosos na área do direito, no Brasil, basta o ex-procurador-geral da República, Claudio Fonteles.
Católico fervoroso, ele recorreu ao Supremo contra os dispositivos da Lei de Biossegurança que autorizam, sob estritas condições, pesquisas com células-tronco embrionárias descartadas em clínicas de reprodução assistida – talvez a mais ambiciosa aposta das ciências biomédicas, para o bem da humanidade, neste começo de século 21.
Perto das indispensáveis informações para prognosticar qual possa ser o papel de um eventual ministro Direito em relação a esse e outros temas aparentados, chegam a ser descartáveis os bastidores políticos da sua anunciada indicação, de que a imprensa se ocupa.
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