Duas palavras sobre o lúgubre balanço da imprensa americana apresentado na recém-divulgada edição deste ano da série The State of the News Media, comentada na quarta-feira, 18, pelo jornalista Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa [role a página para ler aqui].
Em meio à monumental coleção de más notícias para a “velha mídia” – resumindo, as receitas dos jornais diários nos Estados Unidos caíram 23% nos últimos dois anos e a recessão só agravará a tendência – o estudo afirma:
“O problema do jornalismo americano não é fundamentalmente um problema de audiência ou um problema de credibilidade. É um problema de receita. Isso torna a situação melhor do que poderia ter sido.’
De fato, a maioria dos leitores que em proporções crescentes adotam a internet como a sua fonte primária de informação vão procurá-la nas edições online daqueles mesmos jornais.
Então, se é verdade que a migração para a web obriga a indústria jornalística “a se reinventar antes do que imaginava”, como diz o estudo, é ‘mais verdade’ ainda que a natureza dessa reinvenção permanece nebulosa, ou, pelo menos, uma questão em aberto.
Seria diferente se o leitorado, majoritariamente, desse as costas a jornais e revistas – na versão impressa e online – porque a internet lhe ofereceria alternativas mais ricas em conteúdo, mais dignas de confiança e mais abertas à participação.
Nesse caso, estaria, sim, em xeque, o modelo consagrado de jornalismo, que consiste em identificar, apurar, conferir, debater, interpretar e apresentar o que entende por notícia no infinito caleidoscópio dos acontecimentos – o conjunto de procedimentos que compõem o modo de produção informativa.
Mas a julgar pela enxurrada de críticas à chamada mídia convencional em praticamente todos os espaços em que é discutida, tem-se a impressão de que o modelo em que ela se baseia e sob o qual opera se tornou obsoleto. Ou, pior: fracassou por vícios insanáveis que viviam encobertos antes que o advento da internet os escancarasse a um público até então indefeso.
Para dizer o mínimo dos mínimos, falta provar a acusação, desautorizando, por exemplo, o diagnóstico de uma pesquisa tão rigorosa sobre o estado da imprensa americana como essa que de aqui se trata, produzida por uma instituição de indiscutível isenção e competência.
Repetindo: “O problema do jornalismo americano não é fundamentalmente um problema de audiência ou um problema de credibilidade.”
Ou muito se engana este blogueiro, ou isso se aplica à boa imprensa de qualquer lugar. Sejam quais forem as suas atribulações financeiras, jornais de qualidade como o El País, o Financial Times, o Guardian, o International Herald Tribune, o Le Monde, o La Reppublica, para citar os mais óbvios fora dos Estados Unidos, merecem a confiança dos seus leitores em qualquer plataforma não porque reinventaram a roda, mas porque a fazem girar conforme os melhores procedimentos testados e aprovados do ofício.
Pena que não dê para incluir nenhum diário brasileiro nessa divisão especial do jornalismo – e pensar, sem saudosismos, que já se esteve mais perto de chegar lá. Mas essa é outra história.
Fica então a pergunta limpa e lisa: do que se está falando exatamente quando se fala em reinvenção da imprensa?
Como se dizia na velha mídia, “cartas para a redação”.