A Exame precisa melhorar seus controles de qualidade.
A edição datada de 1 de março contém, sob o título “Uma ameaça às Múltis brasileiras. A ascensão do nacionalismo radical na América Latina põe em risco investimentos de empresas como Petrobrás, Vale e Ambev”, a seguinte pérola:
“A crescente onda esquerdista na América Latina é vista com entusiasmo por alguns setores do governo petista, mas tem causado muita preocupação às multinacionais brasileiras. Não é para menos. Empresas como Vale do Rio Doce, Petrobrás, Ambev, Gerdau e Odebrecht (veja quadro) têm um faturamento na região da ordem de 15 bilhões de dólares. Com tanto dinheiro em jogo, essas companhias estão apreensivas com a instabilidade política que está tomando conta do continente”. (Grifo meu.)
Exame consegue a proeza de rever a História da América Latina. Teria sido politicamente estável, mas agora “a instabilidade política (….) está tomando conta do continente”. Sem comentários.
Mais adiante, numa reportagem contra o empresário português Belmiro de Azevedo (“Ele não gosta do Brasil. As peripécias de Belmiro de Azevedo, o polêmico empresário de Portugal que já avisou que pretende vender a Vivo” – subtítulo esculpido a marretadas, por sinal), lêem-se adjetivações como “estilo espalhafatoso” e “temperamento irrequieto”.
Abusa-se do “off” para bater na vítima: “´Ele tentou organizar fundos de investimentos que comprassem parte do negócio, mas não conseguiu´, conta um executivo que acompanhou a construção do shopping Parque Dom Pedro, em Campinas (….). ´A falta de interesse do investidor brasileiro o deixou frustrado e irritado´.”
Por que o informante em “off” não tem coragem de dar a cara, se se trata de uma opinião sobre condução de negócios? (*)
Não sei quem é Belmiro de Azevedo. Não posso avaliar se a reportagem lhe faz justiça ou não. Mas no escorço biográfico que o apresenta diz-se o seguinte, em tom de crítica:
“Em Portugal, as grandes decisões são tomadas quase em conjunto por representantes do governo e dos poucos clãs tradicionais, como as famílias Espírito Santo e Mello, controladoras dos dois maiores bancos portugueses. Nesse contexto, ele é visto como um intruso”.
Tenham a santa paciência, mas defender os moldes do pré-histórico capitalismo português não devia ser argumento numa revista que já se pretendeu moderna e modernizadora.
(*) Mais sobre “off”. Também não conheço o Sr. Ivan Zurita, presidente da Nestlé brasileira. Mas na mesma edição da Exame, sob o título “Ivan, o incrível”, anotam-se as seguintes “plantações”:
“O grande número de atividades de Zurita desperta uma curiosidade natural no mercado. Como ele faz para conciliar os papéis de presidente de multinacional, dono de empresa de agronegócio e promotor de eventos sociais? ´Só dá certo se ele não dormir´, diz um dos mais respeitados headhunters do país”.
“A vida multitarefa de Zurita, porém, vem recebendo algumas críticas. No mercado, há uma corrente que especula que o lado empreendedor do presidente da Nestlé esteja ligado a planos de aposentadoria. (Zurita nega enfaticamente qualquer projeto nesse sentido.) Além disso, sua exposição pública contrastaria com a cultura de uma empresa conservadora como a Nestlé. ´Se eu estivesse na matriz, detestaria ver meu presidente aparecendo tanto sem o chapéu da empresa´, diz um executivo próximo à Nestlé. ´Esse comportamento não traz benefícios à companhia´.”
Será que a revista deveria embarcar nesse uso covarde do anonimato? Não se põe assim a serviço de interesses negociais?
Cartas para a redação. E quem conhecer os bastidores desses assuntos por favor se manifeste.