A palavra italiana imbroglio tem sido usada com grande freqüência na imprensa. Sinal dos tempos. Mas sempre com grafia errada, porque os grandes dicionários, Aurélio e Houaiss, se distraíram e estamparam “imbróglio” (com acento), como se isso fosse aportuguesamento. Em português o encontro consonantal “gl” não soa como em italiano. Soa como em “glicínia”, “glaucoma”, etc. Mal comparando, é como se “abat-jour” tivesse sido aportuguesado em “abatejour” e não em “abajur”.
Todos os dicionários estão errados? Não. Antônio Geraldo da Cunha, autor do Dicionário Etimológico Nova Fronteira, escreve “imbrólio”. O Vocabulário Ortográfico da Academia Brasileira de Letras (ver em www.academia.org.br), que só registra palavras vernáculas, ipso facto desconhece imbroglio. Na Enciclopédia Delta-Larousse, publicada em 1972 sob a direção de Antônio Houaiss, o registro está correto: imbroglio, palavra italiana. Como no dicionário Webster (www.webster.com) ou no Petit Robert. Então, escolham, senhores redatores: ou imbroglio grafado como palavra estrangeira, ou, se é para aportuguesar, imbrólio. O que não tem cabimento é “imbróglio”.
Hábeas-córpus: vários jornais aportuguesaram a expressão, com o que ela ganhou um hífen inexistente em latim. Muito bem. Mas grafam “hábeas-corpus”, negligenciando o acento em “corpus”. Sem acento, toda palavra terminada em “i” e “u”, seguidos ou não de “s”, é oxítona. “Javali, sururu”. (Quando o “i” e o “u” tônicos não formam ditongo com vogal anterior, ganham acento, como em aí, viúvo, etc.) Então, quando se escreve “corpus” se indica a pronúncia “corpús”. Caminho equivalente seria, por exemplo, escrever bônus ou tônus sem acento. O Houaiss fica no pior dos mundos: dá habeas corpus em português sem nenhum acento. Soaria “habêas (todos os exemplos que o próprio Houaiss dá de palavras formadas com o sufixo “ea” levam acento na sílaba tônica: “áurea”, “macarrônea”, etc.) corpús”. Acento é fator de democratização da língua.
“Oitiva”: tenham a santa paciência, senhores parlamentares! A palavra, talvez na busca de um efeito eufemístico, foi usada no jargão da polícia em lugar de interrogatório, disseminou-se insidiosamente na academia e agride o público a cada sessão de CPI. O dicionário, como bem sabe o ilustrado leitor, registra que é “informação que se transmite por ouvir dizer” – de oitiva: por ter ouvido, “de ouvida”, no Houaiss. Já tem jornalista usando “oitiva”. Arre! Comportem-se.