Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Anatomia de um crime

Os repórteres Alan Gripp e Jailton de Carvalho informam no Globo de hoje, com base em trechos inéditos do depoimento à Polícia Federal do então presidente da Caixa Econômica, Jorge Mattoso, que o ainda ministro da Fazenda, Antonio Palocci, soube da quebra do sigilo bancário de Francenildo dos Santos Costa “antes mesmo de receber o extrato [de sua conta-poupança] na residência oficial” [na noite do dia 16].

Mas a repórter Marta Salomon vai mais longe. Escreve na Folha de hoje, também citando o depoimento de Mattoso, entre outras fontes, que a quebra do sigilo deve ter sido acertada na tarde daquele mesmo dia, em um encontro do titular da Caixa com o titular da Fazenda.


“Foi ao retornar ao prédio da Caixa”, apurou Marta, “após o encontro com Palocci no Palácio do Planalto, que Mattoso deu a ordem para acessar a conta do caseiro”.


A partir desse ponto, os relatos dos dois jornais basicamente coincidem.


Mattoso chama o seu consultor Ricardo Schumman. Entrega-lhe o nome completo e o CPF de Francenildo e ordena: “Veja o que ele tem na Caixa.”


Schumann convoca a funcionária Sueli Mascarenhas, superintendente de Recursos Humanos, para fazer o trabalho. Adverte que o assunto é “sigiloso”.


Sueli mobiliza o gerente Jeter Ribeiro. Ela dirá depois à Polícia federal que não lhe passou pela cabeça questionar “ordem vinda do gabinete da presidência; porque são funções de confiança e presume que as pessoas sejam idôneas”.


Por não ter a senha que lhe permitiria executar a ordem vinda, presumivelmente, de “pessoas idôneas”, ela recorreu ao gerente. Este dirá à Polícia Federal que achou a ordem “não usual”, mas, ainda assim, obedeceu. Do seu laptop, acessa a conta de Francenildo. Obtém, imprime e entrega os extratos a Sueli, que os repassa a Schumann.


O consultor vai até o restaurante onde Mattoso jantava para entregá-los. Duas horas depois, Mattoso cumpre o combinado: entrega os papéis a Palocci, na casa dele.


A menos que se imagine que Mattoso e Palocci tenham se encontrado em palácio para jogar conversa fora, a conclusão é inevitável:


Palocci mentiu na carta de demissão e no discurso de demitido, quando disse não ter tido nenhuma participação, “nem de mando, nem de execução”, no que os corregedores da Receita, ouvidos por sua vez pelo Estado, chamam de “acesso imotivado” à conta de Francenildo. E quando disse não ter parte com a divulgação dos extratos – o que, para a Receita, constitui a violação de sigilo propriamente dita.


Assim como, segundo um motorista, o caseiro e um corretor, Palocci mentiu à CPI dos Bingos quando disse nunca ter estado na casa usada pelos seus amigos e colaboradores de Ribeirão Preto.


Enquanto isso – embora se saiba que foi um tucano, o senador Antero Paes de Barros, quem pôs Francenildo em contato com a repórter Rosa Costa, do Estado, para a entrevista-bomba que deu no que deu – passados 16 dias de sua publicação, o governo não conseguiu provar que os R$ 25 mil que começaram a pingar, desde janeiro, na conta do caseiro, se destinavam a comprá-lo para que falasse mal de Palocci.


Continua em pé a versão de Francenildo, confirmada por sua mãe e pelo autor dos depósitos, o empresário piauiense que ele diz ser o seu pai, que o dinheiro deveria servir para que o caseiro desistisse de exigir que o outro reconhecesse a paternidade.


Mas esse lado da história está longe de terminar.


Ou, como escreve hoje na Folha a colunista Eliane Cantanhêde, “Francenildo que se cuide. A guerra não acabou”.


O governo, revela Eliane, “faz das tripas coração para tentar provar que o caseiro tentou extorquir um dos frequentadores da afamada mansão do Lago Sul, o secretário particular de Palocci, Adermirson da Silva.


“A situação acha fundamental desmontar a imagem do caseiro”, destaca a colunista, antes de completar: “Se puder…”


P.S. E por falar em colunista, Dora Kramer especula no Estado de hoje que Anthony Garotinho – sim, Anthony Garotinho – poderia ser o companheiro de chapa do candidato Geraldo Alckmin, o tucano do “banho de ética” e do engavetamento de mais de 60 pedidos de CPI na Assembléia paulista.


Segundo Dora, o raciocínio no PSDB é que o PFL já ganhou tudo a que tinha direito: nove meses no Palácio dos Bandeirantes, e mais dois anos e nove meses na Prefeitura paulistana, com a saída de José Serra.


O arrastar de asas tucanas para o PMDB – e isso já vem sendo comentado há algum tempo – pode não incluir um Garotinho vice. Mas leva jeito de incluir o apoio do PSDB à eventual candidatura Orestes Quércia ao Senado.


Pano rápido. Ou melhor, banho rápido.


***

Serão desconsideradas as mensagens ofensivas, anônimas e aquelas cujos autores não possam ser contatados por terem fornecido e-mails falsos.