Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Conselho rejeita planejamento para 2011

A análise do planejamento da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) para 2011 pelo Conselho Curador da empresa teve um desfecho surpreendente. Pela primeira vez nos três anos de existência da EBC, o Conselho Curador se recusou a deliberar sobre o Plano de Trabalho para os Canais Públicos da estatal, entendendo que o documento não é claro sobre os planos da empresa. Na prática, o silêncio das câmaras setoriais que compõem o conselho significa a rejeição da proposta apresentada pela diretoria técnica da empresa. A decisão de não deliberar foi unânime. Segundo Tereza Cruvinel, presidente da EBC, novas informações serão encaminhadas ao conselho para sanar as dúvidas que tenham ficado.


Uma das grandes falhas apontadas pelas câmaras sequer têm relação com a operação esperada da EBC neste ano, mas toca em um ponto crucial em relação aos princípios que norteiam a constituição da estatal: a transparência. Boa parte dos membros do conselho ficou incomodada com a ausência de um balanço sobre os resultados obtidos na gestão 2010 da empresa. O documento enviado pela diretoria não faz uma avaliação específica sobre as metas estipuladas para o ano passado, omitindo-se sobre o cumprimento dos objetivos ou não. O texto concentra-se nos novos desafios da EBC, restritos aos assuntos envolvendo ‘programação e serviços conexos oferecidos pelos canais públicos’, considerados os temas ‘afetos’ ao conselho na visão da diretoria.


Plano concreto


A restrição do documento a apenas alguns temas envolvendo a operação da EBC, escolhidos pela diretoria, é motivo de discórdia dentro do conselho curador desde a criação da empresa pública. Na visão de alguns conselheiros, a estatal nem sempre tem garantido a participação do conselho em debates considerados relevantes, como é o caso da contratação de empresa para atuar como operador do futuro sistema público de televisão, e de fato existe uma área de sombra sobre se temas gerenciais deveriam ou não ser debatidos pelo colegiado.


Mas, com relação ao planejamento das atividades de 2011, a maior crítica é bastante objetiva: a ausência de um cronograma específico para o cumprimento das metas propostas pela direção da empresa. O único prazo citado no documento é o tempo de vigência do mandato da atual presidente Tereza Cruvinel, que expira em outubro deste ano. Assim, por uma questão prática, a diretoria se compromete a atingir os objetivos descritos durante a gestão da presidente. Os prazos internos para a execução de cada uma das metas, no entanto, não existem. E, o próprio comando da EBC faz um mea culpa logo no início do documento sobre este aspecto.


Segundo o relatório da diretoria da EBC, o ‘alto grau de imprevisibilidade’ da operação de comunicação é o motivo da inexistência de uma previsão temporal sobre quando serão executadas as mudanças propostas na programação da EBC. ‘A gestão de canais de comunicação é regida por alto grau de imprevisibilidade, que se eleva no setor público em função dos regramentos jurídicos. Assim, evitaremos apresentar aqui um cronograma de mudanças na grade ou de estréias, embora tais movimentos devam acontecer, mediante conhecimento prévio do Conselho Curador’, afirma a diretoria da estatal na apresentação do planejamento.


O Conselho Curador entende que a operação no ramo das comunicações é bastante imprevisível, mas a experiência das grandes empresas desse ramo mostra que há um esforço contínuo em tentar reduzir essas incertezas e que a fixação de um prazo continua sendo possível apesar das características peculiares desse mercado. Por isso, os conselheiros entenderam que o documento precisa ser reformulado, expondo um mínimo do plano concreto de trabalho que a EBC pretende adotar. O próprio documento indica que a estatal está produzindo um planejamento mais robusto, embora não esteja previsto o encaminhamento desta nova versão ao Conselho Curador.


Demanda atendidas


Procurada por esta reportagem, a presidente da EBC esclareceu que pretende atender as demandas do Conselho Curador, especialmente com relação aos prazos. Tereza Cruvinel, presidente da estatal, explicou que as informações solicitadas já estão sendo compiladas para a formulação do Relatório de Gestão e do Plano de Metas 2011, documentos que inicialmente seriam encaminhados apenas para os conselhos de administração e fiscal da EBC. ‘Nós temos todas as informações e só não colocamos (no Plano de Trabalho) porque não achamos pertinente no momento. Mas, se o Conselho Curador acha que é importante, nós encaminharemos. Eles mandam, nós cumprimos’, afirmou Tereza.


Esses dois outros documentos devem ser finalizados até março deste ano, quando ocorrem as próximas reuniões dos conselhos. A EBC tem trabalhado para enviá-los aos conselheiros até o dia 14 de março, dez dias antes das reuniões agendadas para o mês, dando tempo para que os detalhes sejam analisados antes da deliberação. Com relação aos custos dos projetos, Tereza insistiu que essas informações, em princípio, não são relevantes para o debate no Conselho Curador. Na visão da presidente, a análise exaustiva feita desses dados pelos conselhos de administração e fiscal é mais do que suficiente para dar transparência à atuação da estatal. Esses dados são encaminhados e avaliados, inclusive, pelo Tribunal de Contas da União.


Tereza esclareceu ainda que a diretoria da EBC fez um balanço das atividades realizadas em 2010 para o Conselho Curador em setembro do ano passado, a pedido dos conselheiros. E, depois disso, não houve mais nenhuma solicitação de informações sobre o resultado das ações planejadas. ‘Se eles queriam uma segunda prestação de contas, deveriam ter pedido. Nós nunca nos recusamos a apresentar qualquer informação.’


Saia justa


A rejeição da proposta anual da EBC ocorreu em uma ocasião delicada: durante a posse dos ministros Aloizio Mercadante (Ciência e Tecnologia), Helena Chagas (Comunicação Social) e Anna de Hollanda (Cultura) no Conselho de Administração da empresa. Apesar do clima ruim, conselheiros ouvidos por este noticiário fizeram questão de dizer que o posicionamento adotado na terça-feira (22/2) não representa qualquer tipo de desabono com relação à diretoria.


Tereza Cruvinel também entende que o episódio não gera efeitos nocivos à EBC, por estar centrado apenas em uma questão de procedimento administrativo. ‘O que seria negativo para a empresa é se houvesse algum questionamento sobre o conteúdo. Isso seria grave’, ponderou a presidente. ‘Mas ninguém jamais apontou até hoje um conteúdo inadequado em nossa programação’, complementou.


Para Tereza, o episódio revela a necessidade de deixar mais claro qual é o escopo de atuação do conselho curador da EBC. A lei de criação da empresa não entra em detalhes sobre até onde os conselheiros devem deliberar sobre a gestão da estatal. E esse perfil legal é compreendido pelos conselheiros como uma intenção do legislador de dar a mais ampla liberdade ao grupo. Mas, pelo que se pode perceber, o entendimento da diretoria não é o mesmo, tornando praticamente inevitável que conflitos dessa natureza continuem ocorrendo.