Terminada a sua primeira coletiva à imprensa do segundo mandato, na terça-feira (15/5), o presidente Lula autorizou o ministro da Comunicação do governo, Franklin Martins, a promover novos encontros do gênero – embora em duas ocasiões tivesse deixado escapar que estava achando a coisa muito demorada. ‘Parece que já respondi a 80 perguntas’, comentou, meio sério, meio brincando. [Foram 15 ao todo, com direito a réplica, ao contrário do que se divulgou.]
Ao dizer para Franklin que ele poderá fazer o que os seus antecessores não puderam, apressou-se a esclarecer que não foi por culpa deles, mas por sua própria culpa. E, voltando-se para os jornalistas: ‘Estou muito mais flexível neste segundo mandato. Aproveitem.’
Dessa flexibilidade ele não se cansou de dar mostras durante a entrevista de duas horas, precedida de uma extensa exposição. Flexibilidade no seguinte sentido: transpirando bom humor e alto astral ele tirou de letra o que lhe perguntavam, sabendo, decerto, que não seria fácil pegá-lo pela palavra, mesmo nas réplicas.
Foi um banho de Lula.
Até diante da pergunta mais constrangedora, que obviamente sabia que lhe seria feita – sobre a participação no seu governo de críticos ferozes no primeiro período, como o deputado Geddel Vieira Lima e o pensador Roberto Mangabeira Unger – disse o que quis e ficou por isso mesmo.
As melhores perguntas foram três:
Aborto. Porque, na réplica, o repórter Celso Teixeira, com boa pontaria, levou Lula a dizer mais do que já tinha dito sobre a sua posição contrária como cidadão e o seu dever como presidente de considerar o assunto uma questão de saúde pública. Pela primeira vez, Lula deixou claro que, por isso, a gestante que não quer o filho precisa ter ‘tratamento adequado’. Ou seja, sem o risco de ser considerada criminosa, como ainda hoje estipula o Código Penal de 1940.
Terceiro mandato. Porque, desafiado pelo repórter Sandro Lima a dizer que não o quer, e, depois, a dizer como reagirá a um projeto de emenda constitucional que lhe permita querê-lo, Lula foi claro como cristal: não quer, respondeu, porque não pode e porque ‘eu não brinco com democracia’; considera ‘imprudente’ e ‘provocação à democracia’ qualquer movimento nesse sentido; e desestimulará qualquer parlamentar da base governista a tentar mudar a regra do jogo.
PT e sucessão. Porque disse ao repórter Fabio Pannunzio, primeiro, que para o seu partido, tendo o maior cargo no governo, ‘mais é querer muita coisa’; segundo, que o seu candidato em 2010 não sairá necessariamente do PT, mas da coalizão que o apoia; e terceiro, que ele quer fazer o sucessor e trabalhará para isso.
Às folhas tantas, depois de soltar um ‘sine qua non’, fez uma pausa, sorriu e comentou: ‘Vocês gostaram do sine qua non.’ Ele já fez essa brincadeira antes. Diverte-o imaginar que os seus interlocutores registrem que, apesar de sua baixa escolaridade formal, sabe falar difícil.
P.S. Dos principais jornais, fizeram perguntas ao presidente repórteres do Globo, Folha, Valor e Jornal do Brasil. Por que o Estado ficou de fora?
Correção acrescentada às 19h18 de 15/5: o Estado não ficou de fora. A repórter Tania Monteiro, da sucursal de Brasília do jornal, participou da entrevista, com uma pergunta sobre eventual aproximação entre PT e PSDB. Desculpas aos leitores e à jornalista.
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