Tuesday, 26 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

TV de governo não é pública: é estatal

Só hoje, no segundo dia do noticiário sobre a intenção do governo de criar uma ‘Rede Nacional de Televisão Pública’, para a difusão por todo o território dos atos e políticas do Executivo federal, a imprensa se lembrou de destacar que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.

Tudo que é estatal é público, mas nem tudo que é público é estatal.

O governo Lula tem seus motivos – aceitáveis ou contestáveis – para investir R$ 250 milhões na criação de sua rede, porque a TV Nacional, da estatal Radiobrás, só chega a 30% dos municípios brasileiros. A nova rede já estava prevista na legislação sobre a TV digital, que multiplica o número de canais disponíveis no sistema aberto.

Mas não queira que se confunda capitão de fragata com campeão de gravata.

Uma rede que utilize um canal da União gerido por órgãos estatais não é pública, é estatal, diz o presidente da Associação Brasileira de Televisão Universitária, Gabriel Priolli.

Está havendo uma confusão entre estatal e público na proposta do ministro de Comunicações, Hélio Costa, aponta o sociólogo Laurindo Leal Filho, da Escola de Comunicação e Artes da USP.

Emissoras públicas de televisão e rádio são ou devem ser a terceira via entre a mídia eletrônica estatal e a mídia eletrônica comercial concedida a grupos privados.

Elas são ou devem ser independentes do poder político e econômico. São ou devem ser sustentadas com recursos assegurados em lei para não ficar nas mãos dos governantes e legisladores de turno, nem depender de publicidade para o pão de cada dia.

São ou devem ser geridas por um conselho de representantes da sociedade e de especialistas. Este conselho deve ter autonomia administrativa e legitimidade social para resistir a pressões externas – políticas, mas não só.

O que de mais próximo se tem disso no Brasil é a Fundação Padre Anchieta, responsável pela TV Cultura de São Paulo. Mesmo assim não é tão próximo como seria de desejar. Na vida real, a blindagem do órgão é relativa. [Leia neste blog o texto ‘Quem paga o flautista dá o tom’, de 12 fevereiro, em http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id={96F273A2-3414-4291-A161-3F1BA9C2A060}&id_blog=3].

Chamar a atenção para a cavalar diferença entre o estatal e o público, na esfera dos meios de comunicação, não é um exercício semântico ou uma pernóstica redescoberta da filosofia medieval do nominalismo.

É fundamental para orientar desde já o debate sobre o mérito (ou falta de) da pretensão do governo, sobre a forma de levá-la adiante (se é que deve ir adiante) e, em geral, para que a população saiba que o fato de uma emissora ser estatal, pública ou concessão privada tem tudo a ver com o que ela informa ou deixa de informar.

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