Na semana passada, acompanhamos (quiséssemos ou não) o julgamento sem precedentes intitulado de ‘caso Isabella’. Em todo meio midiático e em qualquer lugar que nos encontremos há sempre uma referência no que tange ao resultado (condenação ou absolvição) do dito julgamento. Para além de todas as digressões que possam ser feitas, faz-se necessário (ao menos tentar) compreender o que representa a efetiva realização de justiça para a opinião pública. E neste diapasão parece-se estar diante de um dos mais enigmáticos paradoxos que permeiam a atuação da imprensa no Brasil: a imprensa que se sustenta e se esconde em sua (ilimitada) liberdade é a mesma que luta incessantemente pela perda da liberdade de meros suspeitos.
Desde a primeira notícia transmitida sobre o caso, há mais de dois anos pelos meios de comunicação, inúmeras garantias constitucionais dos acusados foram violadas diuturnamente, dentre as quais a garantia constitucional da presunção de inocência e a inviolabilidade da intimidade. Na seara processual penal, o mais intrigante foi a clara desnecessidade da prisão preventiva dos acusados e a discutível imparcialidade judicial (leia-se: dos jurados). Há que se ressaltar que todas as enumeradas garantias (em número exemplificativo) são caracterizadoras de um Estado Democrático Direito, ou seja, são garantias de todos os cidadãos que compõem o dito Estado. Com isso, quer-se dizer que, não os acusados do ‘Caso Isabella’, mas todo e qualquer acusado da prática de um crime têm direito de ver asseguradas ditas garantias.
Decisão do Conselho de Sentença
Neste diapasão, a imprensa como órgão oficial das violações constitucionais em um trâmite processual penal, utilizando-se da carapuça de justiceiros em uma notável incompreensão da não necessária correlação entre o que seja a efetiva justiça aplicada a um caso concreto do que seja a condenação de alguém. O que quer a opinião pública, então? Exatamente o que quer a mídia… Um processo penal às avessas… se possível, o Tribunal de Exceção… a pena de morte. E é neste cenário que se estabelecem as bases para a discussão acerca da existência e eficiência do Tribunal do Júri como órgão competente para o processo e julgamento de crimes (de tamanha complexidade) dolosos contra a vida no Brasil.
Com a vênia de seus defensores, hodiernamente, o Tribunal do Júri merece ter a atenção dos operadores do Direito no que tange a sua reformulação (para além da involução do ano de 2008). Explica-se: os juízes togados não têm a necessidade de julgar casos complexos sem a discussão com outros operadores do Direito; por outro lado, os jurados (leigos) estão fadados à incomunicabilidade, diante do julgamento de um também caso complexo. E o mais grave: sem que a dita incomunicabilidade tenha previsão constitucional. Para arrematar, critica-se ainda a decisão imotivada do Conselho de Sentença: sim; os jurados decidem sem que saibamos por que fizeram. Sem sombra de dúvidas, são os jurados representantes da opinião pública e, diante de tantas imperfeições do Tribunal do Júri e a da atuação marcante do meio midiático, a efetividade da justiça pode ser mesmo defendida?
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Advogado criminalista, mestre em Direito e professor de Processo Penal na IMED – Passo Fundo (RS)