Na terça-feira da semana que vem se saberá se deram algum resultado as críticas amplamente divulgadas pela imprensa à decisão de duas comissões do Senado, reunidas em sessão conjunta na quarta, 2, de aprovar um projeto de reforma eleitoral que manteve a decisão tomada em julho pela Câmara de tolher a liberdade de opinião na internet sobre candidatos e partidos nos três meses de campanha oficial.
É que as reações entre os próprios senadores ao cerceamento da internet – do tucano Arthur Virgílio ao petista Aloizio Mercadante – acabaram transferindo para a próxima terça a votação em plenário que deveria se seguir à reunião das comissões. [Para valer nas eleições de 2010, o projeto precisa passar no Senado, de novo na Câmara e virar lei até o dia 3 de outubro, um ano antes do primeiro turno.]
Tais reações não vieram do nada. São o reconhecimento de que a parcela da opinião pública que se interessa por essas coisas vinha sendo alertada pelos jornais para o absurdo de equiparar a internet ao rádio e à televisão para fins do que nela se pode ou não se pode fazer no período eleitoral.
Como se sites, blogs, comunidades de relacionamento e ferramentas para envio de mensagens pessoais dependessem de concessão, como a mídia eletrônica tradicional, para existir. E o jornalismo online pudesse, portanto, sofrer restrições legítimas no modo como cobre a disputa pelo voto.
Essa falsa semelhança tinha sido exposta em reportagens, colunas de opinião e editoriais quando a nova regulamentação do processo eleitoral passou na Câmara. O Estado de S.Paulo, por exemplo, falou em “mordaça política”. A Folha, em “tutela eleitoral”.
O assunto e as suas repercussões foram abordados neste blog no artigo “Os limites da liberdade”, de 9 de julho.
O problema vem de longe. A Lei Eleitoral de 1997 proibiu o rádio, a TV e, por extensão, a internet de “veicular propaganda política ou difundir opinião favorável ou contrária a candidato, partido, coligação, a seus órgãos ou representantes” – ah, o detalhismo da legislação brasileira! – durante as campanhas.
Agora, o senador Aloizio Mercadante diz que vai apresentar uma emenda revogando esse item censório, mas garantindo o direito de resposta aos políticos e partidos que se considerarem atingidos pelo que sair na internet a respeito deles.
Mais simples e direto ao ponto do que a alternativa do tucano
Eduardo Azeredo. Conforme o citou o Estado, “vamos fazer uma emenda de plenário para deixar claro que a parte da internet que se assemelha a jornal siga as regras de jornal. Já a parte da internet que se assemelha a rádio e televisão segue as regras de rádio e televisão.”
Mas, como objetou o colunista da Folha (e blogueiro) Fernando Rodrigues, “hoje, qualquer portal, site ou blog já apresenta texto, áudio e vídeo integrados”.
Veio a calhar, a propósito, a manifestação do ministro Carlos Ayres Britto, do STF, que também preside o Tribunal Superior Eleitoral, sobre o caráter livre da internet. No texto em que formaliza a decisão do Supremo de extinguir a Lei de Imprensa, ele ponderou:
“Silenciando a Constituição quanto ao regime jurídico da internet, não há como se lhe recusar a qualificação de território virtual livremente veiculador de ideias, debate, notícia e tudo o mais que se contenha no conceito essencial da plenitude de informação jornalística no nosso país.”
A questão tem ainda outro lado. Supondo que se justificasse tratar a internet como rádio e TV, ainda assim haveria um abismo de diferença entre fiscalizar um meio e o outro e punir em cada caso as possíveis transgressões. Controlar a rede é parecido com enxugar gelo.
Isso sim merecia mais atenção da imprensa.
Aos leitores
O blogueiro ficará fora do ar durante a próxima semana.