Como toda novidade, o jornalismo de mão dupla está entrando agora no que se poderia chamar de ressaca participativa. O deslumbramento da descoberta de uma nova ferramenta de comunicação passa agora a ter que conviver com temores, explosões de raiva, catarses, ressentimentos e tentativas de retomar o controle sobre o que é publicado. O ambiente, que até agora era marcado pela expectativa e pelo otimismo começa a ser marcado por uma crescente polêmica entre autores e comentaristas em weblogs, para citar o caso mais visível. Muitos autores se queixam da incontinência verbal de muitos leitores, enquanto estes classificam como censura as iniciativas para controlar o que é publicado num blog. A discussão está apenas começando e deve ir longe porque não está em jogo apenas a adoção de códigos de conduta ou normas técnicas que regulem o relacionamento entre dois tipos diferentes de produtores de conteúdo, na nova ecologia informativa da internet. É um novo conjunto de comportamentos que está sendo criado num ambiente online cujos limites ainda são pouco claros. O jornal inglês The Guardian embarcou num projeto que tem o polêmico nome de Comment Is Free (O comentário é livre), um site onde são publicados blogs de vários profissionais do jornal e onde os leitores devem se cadastrar para comentar os textos publicados. Trata-se de uma iniciativa de valorizar a conversa jornalística online eliminando o uso de expressões grosseiras e acusações gratuitas nos comentários à blogs. Mas a reação inicial dos leitores foi negativa, na medida em que muitos viram no cadastramento uma limitação da liberdade de comentário. Vários outros grandes jornais europeus e norte-americanos adotam também algum tipo de restrição. Aqui nos blogs do Observatório da Imprensa, os autores tem a opção de selecionar os comentários antes de publicar ou não impôr nenhuma restrição, o que não é criticado por alguns comentaristas. Muitos leitores classificam como censura qualquer tipo de limitação, ignorando as nuances existentes entre a liberdade absoluta e a postura policialesca dos censores militares. O recurso fácil à polarização não ajuda a entender o problema e muito menos buscar uma solução para o problema. Os excessos verbais, xingamentos, sectarismos e radicalismos são anteriores ao surgimento da comunicação de mão dupla na Web. Só que eles se tornaram mais visíveis para a maioria dos internautas depois que a internet permitiu que os antigos leitores se tornassem também autores, dando origem à comunicação de mão dupla, ou conversação jornalística. Estamos vivendo um período de descobertas e de transição de um modelo de comunicação unidirecional para outro multidirecional. O jornalista profissional perdeu o monopólio da notícia. A importância do controle do fluxo informativo está passando por transformações radicais e a crítica da mídia tornou-se uma ferramenta de contextualização. Nesta transição confrontam-se dois tipos de experiências opostas quando se trata de autoria: a dos profissionais que tem uma longa tradição de convivência com códigos de conduta e regras corporativas, enquanto do outro estão milhões de pessoas que nunca tiveram a possibilidade de publicar nada, ou seja serem ouvidas, e que, por conta disto, acumularam uma grande frustração. A ressaca participativa é o resultado direto da fruto da oscilação pendular sempre que algum grande obstáculo social é removido. Ela não é negativa e nem positiva. É um fato para ser analisado dentro do novo contexto de dualidade na produção de conteúdos. De nada adiantam comportamentos passados porque nem o controle resolve e nem muito menos os xingamentos. Conversa com os leitores: O Código Aberto não seleciona comentários, mas já arquivamos vários textos que incluiam linguagem agressiva, propaganda partidária e mensagens comerciais. Não sou o dono deste espaço embora seja o responsável por ele. Os leitores também são co-responsáveis. Por isto tentarei sempre preservar o interesse coletivo.