Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Lula louva a imprensa – a estrangeira

Diz o presidente Lula, corroborando o ministro Guido Mantega, que “se a gente quiser saber as coisas que o mundo pensa do Brasil, temos que ler a imprensa estrangeira”.

Mas ele não estava criticando a imprensa nacional por não relatar adequadamente o que “o mundo pensa do Brasil”.

Ele estava acusando a imprensa nacional de ser pessimista em relação ao Brasil em contraposição ao que considera ser o otimismo da imprensa estrangeira.

É falsa, no entanto, a dicotomia – para não falar em visão maniqueísta.

Primeiro, porque a imprensa estrangeira – especificamente a revista britânica Economist, citada por Mantega – ao mesmo tempo em que registra a boa situação da economia brasileira, ressalva que o Brasil ainda cresce menos do que a média mundial e menos do que os países ditos emergentes de que o país faz parte.

Segundo, ressalva também que o crescimento brasileiro está limitado, entre outras coisas, pela incapacidade ou falta de vontade do governo Lula de fazer as reformas tributária e previdenciária e, principalmente, de cortar o gasto público.

Não digo com isso que a imprensa estrangeira está certa nas suas cobranças. Digo apenas que as faz – até por convições doutrinárias. O melhor exemplo, de novo, é a Economist.

Terceiro, a imprensa estrangeira ressalva ainda o que entende ser a baixa qualidade da gestão Lula, exemplificada na interminável demora em eliminar os gargalos da infra-estrutura física do país. O governo brasileiro, escreve-se lá fora, só administra bem as suas políticas sociais, notadamente o Bolsa-Família [o que até o mais anti-lulista dos grandes jornais brasileiros, o Estado, reconheceu recentemente].

Quarto, ressalva e, mais do que isso, destaca, o problema da corrupção. Jamais li em qualquer jornal categorizado do exterior, do New York Times ao Financial Times, do Le Monde ao El País, que o mensalão não existiu – ou que o PT, no governo, continuou a ser o partido guardião da ética que apregoava ser quando na oposição. Muito ao contrário.

Agora, quanto à suposta relutância da imprensa brasileira em mostrar o tal do “lado bom das coisas”, até parece que os assessores diretos do presidente não depositaram na sua mesa as edições de sábado passado dos jornais da terra, com páginas e páginas dedicadas às boas notícias da mais recente pesquisa do IBGE sobre as condições de vida dos brasileiros [a PNAD de 2006].

Apenas a Folha destoou do alto astral geral, lembrando em manchete que o crescimento de 7,2% da renda do trabalhador naquele ano, embora represente a maior alta desde 1995, ainda não bastou para que o rendimento médio da população assalariada [calculado em R$ 888] ao menos empatasse com os R$ 975 de 1996].

O jornal destoou, mas não inventou.

Quem mais se queixou dos comentários da imprensa sobre os números da PNAD foi a ultradireita. Um dos seus blogueiros mais vociferantes desancou o Estadão pelo editorial “Uma pesquisa explica a outra”, da última terça-feira.

Isso porque o jornal ligou os números altamente favoráveis a Lula na primeira sondagem que encomendou ao respeitado Instituto Ipsos aos números favoráveis ao povo, apurados pela PNAD.

Por fim, é cacoete autoritário dizer que a imprensa fala mal do país, quando fala mal do seu governo de turno. Isso era o que alegava a gorilada do regime militar para acusar a mídia de impatriótica e de fazer o jogo da subversão.

Da boca de Lula: ”Voltei [da viagem à Escandinávia e à Espanha] convencido de que o Brasil não pode aceitar os discursos que nós fazemos diminuindo o Brasil, nem tampouco os discursos de algumas pessoas que tentam criar dificuldades.”

Jornalistas que não tentam criar dificuldades, mas apurar as verdades, por mais difíceis que possam ser para os donos do poder, e que tem anos suficientes de janela para lembrar dos velhos maus tempos, decerto ficaram chocados com esse “o Brasil não pode aceitar…”.

Ainda bem que é apenas uma figura de linguagem. Ou não?

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