A qualificação socialmente responsável bem que poderia ser uma preocupação onipresente na cobertura da epidemia de gripe suína, mais conhecida agora pelo cabalístico nome oficial de Influenza H1N1 (desenho esquematizado do virus, aqui ao lado).
Estamos diante de uma situação potencialmente muito grave e que no estágio atual está sendo decidida basicamente no âmbito das políticas de informação. É agora que a responsabilidade social de governos e da mídia pode evitar duas situações extremas e igualmente catastróficas.
Minimizar a situação por conta de preocupações comerciais, políticas ou religiosas pode deixar a população despreparada para o evento de a gripe H1N1 tornar-se uma pandemia (epidemia de alcance mundial). Pelo outro extremo, o pânico e a histeria desnecessários podem acelerar a proliferação da doença e torná-la incontrolável.
É claro que os governos e organismos internacionais devem pesquisar vacinas, mas o que realmente está configurando uma emergência informativa é a multiplicação de dados, notícias e informações desencontradas que deixam a população insegura e consequentemente vulnerável a decisões não refletidas.
Boa parte da luta contra a propagação da doença está sendo travada agora no campo da informação, mais do que nos laboratórios farmacêuticos e gabinetes ministeriais. É talvez a primeira vez que um fenômeno como esse acontece num ambiente de avalancha noticiosa e de interatividade direta entre cidadãos, pela internet.
Por dever de ofício e por experiência própria, os jornalistas e a imprensa enfrentam uma conjuntura complexa porque estão na obrigação de corrigir erros governamentais em matéria de fluxos noticiosos e, ao mesmo tempo, resistir ao apelo fácil do sensacionalismo como forma de aumentar o faturamento comercial.
Um passeio pelas páginas dos jornais e pelos noticiário da rádio e televisão mostra uma dupla percepção da crise gerada pela H1N1:
1) A Organização Mundial da Saúde traça um panorama sombrio com advertências cada vez mais carregadas de pessimismo. No México, o governo adota medidas de guerra enquanto nos Estados Unidos começam a surgir sinais de histeria, especialmente na Califórnia, onde os mexicanos passaram a ser vistos como uma ameaça social.
2) Por um lado, os dados estatísticos mostram um quadro bem diferente. Nos Estados Unidos e no México, a incidência atual de casos de gripe é considerada moderada e com uma freqüência 50% menor do que em janeiro e fevereiro, os meses de inverno em que os casos de gripe são mais comuns, sem no entanto serem considerados endêmicos.
Mais do que em qualquer outra situação, cabe aos jornalistas uma reflexão profunda sobre as implicações de sua responsabilidade informativa. Não basta agir convencionalmente seguindo as rotinas habituais, como mandar um correspondente para o México para mostrar o medo e a insegurança da população local.
Numa situação como esta, a missão principal de um correspondente é procurar no México elementos para que os brasileiros possam decidir o que fazer aqui para evitar a propagação da doença. Semear o medo, mesmo que de forma sutil, é uma atitude inadequada porque pode acabar gerando uma situação artificial, pelo menos por enquanto.
A divulgação de dados e notícias não confirmadas, como vem acontecendo em vários países e que são reproduzidas ad nauseam pela imprensa e por weblogs, amplia a epidemia de insegurança informativa que torna as pessoas ainda mais vulneráveis aos efeitos da gripe.
O objetivo deste post não é cair de pau na imprensa e nem apontar a metralhadora denuncista em direção ao governo. A preocupação é mostrar a necessidade de pensar antes de publicar. É quase redundante dizer isto, mas a rotina das redações tornou quase automática a produção de notícias. A tentação do furo jornalístico está associada à pressa e ao aumento do risco de erros.
Os jornais, revistas, emissoras de televisão e rádio, bem como as páginas informativas na Web deveria instalar grupos especializados no monitoramento do material publicado tendo como função especifica verificar a responsabilidade social de cada informação publicada. Trata-se de um procedimento que não está incluído na maioria dos manuais de redação, mas que provavelmente se tornará compulsório face a complexidade da nova conjuntura informativa criada pela internet.