O jornal The New York Times às vezes surpreende a gente com algo totalmente inesperado. Neste domingo, o editor Byron Calame, que funciona como uma espécie de ombudsman dos leitores, fez o que deveria ser uma rotina em todos os veículos da imprensa que levam a sério a sua responsabilidade social na informação. Calame foi pesquisar nos arquivos do jornal para saber que tipo de informação foi publicada nos últimos 10 anos sobre os dois temas mais polêmicos em toda a tragédia de Nova Orleans: o alto índice de pobreza entre os habitantes negros da cidade e a crônica fragilidade dos diques que protegiam as áreas mais densamente povoadas. O editor de público do NYT partiu do princípio de que o jornal tem um compromisso com os seus leitores que inclui, entre outras coisas, o dever de alertar sobre situações potencialmente ameaçadoras ao bem estar das comunidades. Este compromisso, citado com frequência em discursos solenes e em efemérides jornalisticas, é rotineiramente esquecido no dia a dia das redações, quando é mais importante atender os anunciantes ou os poderosos. Calame resgatou a responsabilidade do jornal em relação ao seu público, sem usar a desculpa fácil de que a culpa pela miséria nos guetos negros de Nova Orleans e a incúria administrativa na manutenção dos diques cabia à prefeitura local e ao governo da Luisiana. Isto seria o normal nesta situação anormal. Os resultados da pesquisa deixam o The New York Times numa situação desconfortável. O jornal abordou os temas mencionados mas nunca com o destaque e a insistência que o próprio Byron considerou minimamente necessários para alertar autoridades e a população. A maioria das referências encontradas estavam em parágrafos internos em matérias sobre reportagens relacionadas a outros temas. A maioria das matérias publicadas pelo NYT na última década estava relacionada à culinária, festas, tradições e eventos políticos ou esportivos em Nova Orleans. No texto publicado na edição deste domingo, o editor do leitor do Times salienta que o mero registro de problemas não isenta um jornal de assumir na plenitude o seu papel crítico na cobertura de temas urbanos. Um mea culpa histórico, porque foi feito sem que alguém o exigisse e porque pode deflagrar um exame de consciência interno em toda a redação do mais importante jornal norte-americano. Se todos os jornais fizessem o mesmo, eles seguramente não estariam tão assustados com a perda de leitores e de credibilidade. Aos nossos leitores: Serão desconsiderados os comentários ofensivos, anônimos e os que contiverem endereços eletrônicos falsos.