Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Fontes não identificadas esquentam noticiário e iludem leitor

E não é que o ministro da Fazenda não caiu, apesar do que os jornais anunciaram nos últimos dias?


Ontem, com diversos tons e ênfases, vários jornais acolheram em suas manchetes principais a versão de que o ministro estava com um pé fora do governo. Hoje, esses mesmos jornais contorcem-se em explicações para justificar a previsão que não se confirmou. Algumas delas, como a da Folha de S.Paulo, apontavam até mesmo que o senador Aloizio Mercadante seria seu substituto.


Segundo o versão comum adotada na maioria das reportagens de hoje sobre a reversão das expectativa (que os próprios jornais criaram, diga-se de passagem), o futuro do ministro foi decidido na reunião da última segunda-feira à noite. Nela, Palocci bateu na mesa e, com o apoio do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, convenceu o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, a manter a política de superávit fiscal no médio prazo, tal qual o ministro defendera na audiência da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado.


Contam os jornais que Palocci queria elevar a projeção de superávit dos atuais 4,5% do PIB para 5%, mas convenceu-se com o meio-termo de 4,75% sugerido pelo presidente da República. A chegada a bom termo, porém, foi precedida de queixas do ministro contra o fogo amigo disparado de dentro do governo (ministra Dilma Rousseff), e a decisão de Palocci de deixar o governo.


Essa é a versão que permeia a reportagem que sustenta a manchete principal do O Globo de hoje, no único exemplo de título nobre que atribui ‘fortalecimento’ ao ministro. A reportagem do O Globo descreve no detalhe os diálogos ríspidos entre Lula e seu ministro. Porém, da mesma forma que as reportagens dos dias anteriores dos demais jornais, que davam a saída do ministro como líquida e certa, a fonte das preciosas informações não é identificada.


Também, mais uma vez, O Globo atribui a origem das indiscrições a ‘petistas’ ou a ‘amigos petistas’. Além de vago e repetitivo, a mídia concede importância crucial a depoimentos e revelações de ‘petistas’, algumas vezes sem sequer identificar sua proximidade com o assunto em pauta. Esse recurso da denominação vaga de fontes com informações cruciais não é novo na imprensa brasileira. No período da ditadura, era comum encontrar ‘segundo fontes militares’ nas reportagens para maquiar falhas na apuração, plantações de meias-verdades ou meias-mentiras e até mesmo opiniões pessoais dos jornalistas.


O mesmo uso abusivo de fontes não identificadas repete-se agora com o superpopulação de ‘petistas’ nas reportagens. Nos últimos dias, esses ‘petistas’ apontaram até que o senador Aloizio Mercadante seria o novo ministro. Se fosse verdade, e se confirmasse, não faltariam menções do tipo ‘como este jornal antecipou’. Mas como deu em nada: o furo n’água sobra para ‘o petista’ – e os repórteres se recolhem por alguns dias, até nova onda do noticiário justificar a presença de novos ‘petistas’ como fontes não identificadas.


Está se tornando monótono e motivo para não acreditar integralmente no que se lê.