O TSE julgou que o governo transgrediu a legislação eleitoral ao conceder, por cinco medidas provisórias, aumentos acima da inflação a sete carreiras do funcionalismo, ou 160 mil servidores, em 30 de maio.
Seis dos sete ministros do tribunal, a começar do seu presidente Marco Aurélio de Mello, entenderam que o presidente Lula não poderia dar os aumentos depois de 3 de abril, a menos de seis meses da próxima eleição, portanto. Curiosamente, o único voto discordante foi o do relator da matéria, Gerardo Grossi.
Em consequência da decisão, o presidente resolveu adiar a assinatura de outras cinco MPs para beneficiar com aumentos reais de salários mais 260 mil servidores.
Os aumentos concedidos e os suspensos, estes à espera de parecer da Advocacia-Geral da União, completam um plano de reestruturação de carreiras que incluiria mais de 1,3 milhão de funcionários federais, civis e militares, na ativa e aposentados.
Estes são os fatos – mas não todos. E conforme o jornal de sua preferência, o leitor, principalmente aquele sem tempo ou paciência para ler matérias até o fim, poderá ficar menos ou mais bem informado sobre um assunto cujos desdobramentos políticos são óbvios. A oposição decerto tentará usar a decisão da Justiça Eleitoral para pedir a impugnação da candidatura de Lula.
O fato que os jornais destacaram ou deixaram de destacar é simples. Como se lê apenas no nono dos 11 parágrafos da matéria do Estado – e já no resumo que a Folha traz entre o título e o começo do texto das matérias mais importantes – “a interpretação de Marco Aurélio não é uma unanimidade”.
O ponto é o seguinte: a lei de fato proíbe aumentos reais a funcionários públicos nos 180 dias anteriores a uma eleição – mas só quando forem concedidos a todo o funcionalismo. O que não é o caso agora.
Como explica o Globo a meio caminho de sua matéria, citando um ministro do TSE não identificado, “aumentos para categorias específicas ou mediante aleteração no planao de cargos são proibidos apenas 90 dias antes da eleição” [ou seja, a contar de 3 de julho].
E um ex-ministro do TSE, José Eduardo Alckmin, também ouvido pelo Globo, lembra que já há “decisão antiga” do tribunal de que é possível conceder aumentos setoriais no período eleitoral. [A decisão é de 2002.]
O Valor dá a palavra a uma fonte do governo que demonstra com um exemplo que não houve revisão geral da remuneração dos servidores: o pessoal do BC obteve 10%, os professores das universidades federais, 5%.
O ministro Marco Aurélio de Mello – o mesmo que em 24 horas apertou e depois afrouxou os parafusos da verticalização e que, assinalou à época o Valor, é “o ministro mais polêmico da história recente do Supremo” – pensa diferente.
Para ele o governo “tripudiou” da lei que “veda a possibilidade de se cooptar eleitores mediante bondades e essas bondades só são lembradas em época de eleições”.
Marco Aurélio considera irrelevante a distinção legal entre aumentos generalizados e aumentos setoriais com reestruturação de carreiras. “Mais importante do que o aspecto formal [da lei] é o conteúdo”, opinou. E foi nesse contexto que falou das bondades.
O resumo da ópera é que alguns jornais destacaram menos do que deveriam, se quisessem dar ao leitor o melhor pelo seu dinheiro, a principal dimensão do caso – a controvérsia que antepõe o ministro Marco Aurélio a diversos dos seus colegas de ofício.
Mas a decisão do TSE não foi tomada por 6 votos a 1? Foi. Assim como a que arrochou e – sob pressão política – logo em seguida desarrochou a regra da verticalização.
Salvo um ministro em cada caso [os relatores das respectivas matérias] os demais parecem acompanhar a posição do presidente do tribunal, mesmo quando ela pode ser uma hoje e outra amanhã.
Do modo como certos jornais dão hoje a história dos aumentos salariais, até parece que a Justiça mostrou “cartão amarelo” para Lula, como diz o editorial do Estado – e que esse ato tem o apoio majoritário dos juristas que conhecem de perto a legislção eleitoral.
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