Na segunda-feira, quando o repórter Fábio Zanini, da Folha, deu em primeira mão a história do documento ‘em discussão na campanha petista’ com propostas de uma política de mídia em um governo Lula II – de que se ocupariam amplamente nos dias seguintes todos os grandes jornais e o Observatório da Imprensa, entre outros sites –, escrevi:
‘Agora que o repórter levantou a lebre, falta saber quanto ela vale. Ou seja, que chance tem a proposta de ser adotada no governo de coalizão Lula II. Para isso, seria preciso conhecer os seus patrocinadores no PT e o seu calibre político. Sem isso, a discussão da idéia corre o risco de ser um exercício de abstração.’
Foi o que fez o repórter Paulo Moreira Leite, do Estado. A garimpagem rendeu hoje a matéria ‘Texto sobre controle da mídia é criação de assessor de Dulci’, com o sub-título ‘Fábio Koleski, autor das propostas, sustenta que não as submeteu ao chefe’.
O texto entrelaça informação [sobre a origem do documento e sua possível ‘tramitação’] com opinião [sobre o mérito das idéias – ‘preocupantes’, segundo Moreira Leite]. Por isso, resolvi transcrever a reportagem para o leitor julgar por si só uma coisa e outra. Lá vai:
‘O DNA do documento da campanha de Lula que propõe medidas de pressão sobre a mídia a pretexto de ‘democratizar’ os meios de comunicação aponta para o gabinete de Luiz Dulci, ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência da República. Ali despacha o jornalista Fabio Koleski, autor do texto intitulado Comunicação e Democracia. Koleski é um dos principais assessores de Dulci, ministro que é o único sobrevivente do chamado ‘núcleo duro’.
Ele conta modestamente que ‘sistematizou’ sugestões de dezenas de militantes do partido, que podem ou não a ser incluídas no programa de governo. O texto sugere, por exemplo, a criação de ‘assembléias populares’ para a revisão de concessões de rádio e TV; a formação de uma Secretaria de Democratização da Comunicação no Planalto; a distribuição de incentivos oficiais para jornais independentes.
São idéias particularmente preocupantes quando se considera que foram alinhavadas por um funcionário do Planalto, com responsabilidades oficiais – e não por um militante de fim de semana. Koleski, que nem é filiado ao PT, conta que trabalhou fora do expediente na produção do texto. Ele garante que Luiz Dulci não leu o texto, mas essa versão é questionada por quem conhece o funcionamento do governo. ‘Dulci é responsável pela comunicação e ao menos em tese esse assunto passa por ele’, diz um ex-ministro.
Um intelectual petista respeitado na legenda define o documento como ‘lunático’. Nos últimos dias Koleski foi orientado pela coordenação da campanha a fazer silêncio sobre o assunto, ‘pois não se tomou nenhuma decisão quanto ao conteúdo das propostas’. O depoimento sugere que ele apenas reuniu idéias alheias, sem estar de acordo com todas elas. Indagado se, por hipótese, teria incluído no documento uma proposta que absurda – a hipótese colocada foi uma fantasiosa anexação do Brasil pelos Estados Unidos – ficou em silêncio.
As idéias de Democracia e Comunicação passarão por várias instâncias, dentro e fora do PT, até chegarem ao cidadão que terá a palavra final – o próprio Lula. A discussão sobre os meios de comunicação é um tema real dentro do PT. Um assessor da campanha compara 2002 e 2006 para dizer que hoje os ânimos estão quase belicosos. Muitos petistas reclamam da imprensa como se o mensalão fosse uma criação de repórteres.
Como assessor do Planalto, Koleski teve um papel de destaque na redação que produziu um irretocável discurso do presidente Lula sobre a liberdade de imprensa, lido no encontro da Associação Nacional de Jornais (ANJ). No papel de ‘sistematizador’, realiza um movimento que um colega define como ‘bipolar’.
Até hoje o PT cultiva a idéia de que é preciso ‘democratizar’ a comunicação. ‘Precisamos fazer uma revisão geral em todas as concessões de rádio e TV’, afirma o professor Laurindo Leal Lalo Filho, da Escola de Comunicação e Artes da USP, uma vez influente no partido.
Com o argumento de que é preciso estimular a concorrência, os petistas falam na ‘democratização dos meios de comunicação’ como se fosse a coisa mais normal do mundo, quando é uma expressão que carrega a idéia de intervenção do Estado numa área onde sua presença é sempre perigosa. Em silêncio auto-imposto sobre temas da campanha, o presidente da Radiobrás, Eugenio Bucci, já deixou claro que tem um pensamento diverso em vários aspectos.
Em março, num depoimento ao Observatório da Imprensa, ele falou do ‘Estado anunciante’ e do ‘Estado editor’, para dizer que considera ‘preocupante, no Brasil, o volume de verba pública que é canalizado para os meios de comunicação. O governo federal, os governos estaduais e municipais são compradores paquidérmicos de espaço publicitário’. Em outro momento, explicou que ‘o jornalismo precisa guardar distância do governo. Não pode depender de governo, de nenhum governo’. Eugênio Bucci foi instalado na Radiobrás a convite de Lula. Resta saber se essas palavras seguirão agradando ao presidente num eventual segundo mandato.’
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