Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O que seria dos golpistas sem aqueles a quem atacam?

O que era o jornalismo político na época de FHC? Era a política como jornalismo ou o jornalismo como política? Sei que era chocho, sem graça, recatado. Tímido mesmo. Hoje? Ano eleitoral, com uma ex-guerrilheira na disputa? Ah, a coisa anda bem diferente. Saíram das tocas aos montes.


Eliane Cantanhêde, por exemplo, gravou um vídeo para a Folha toda buliçosa, se achando a tal porque contava ao mundo uma ‘novidade’: a direita não suporta cheirar o povo. De acordo com a grande revelação, tucanos e demos se aproximam, sim, da massa, quem diria, mas só da ‘massa cheirosa’. Descobriu a pólvora. É um crânio. Pelo raciocínio apresentado, perfume francês, do tipo que usam os doutores da Sorbonne, é o suprassumo do agradável. Mas há uns bem mal-cheirosos. Tanto que nem seus colegas de partido o admitem ter por perto.


A direita não tem o candidato que gostaria, mas a única opção dos direitistas, que fogem de FHC como o diabo da cruz, é José Serra e é a ele que se agarrarão até a última gota de veneno. E não é preciso ser nenhum crânio para assistir ao veneno sendo destilado em pleno horário nobre. Recentemente, a ‘Vênus platinada’, apelido mais íntimo do que plim-plim, não se acanhou em veicular mensagem subliminar de apoio a José Serra, em vídeo comemorativo dos seus 45 anos de defesa daquilo que Dr. Roberto chamava de democracia. Mas já lá se vão os tempos do empresário midiático que se julgava no poder de jogar pôquer com a sociedade. Numa incrível demonstração de que sabe que já não consegue manipular como antes, a emissora passou recibo e tirou o vídeo do ar. Mas, a direita não há de se sentir órfão, o Jornal Nacional perde audiência, mas, enquanto tiver a quem atacar, não perderá a pose.


O maior câncer que pode haver para a imprensa é o jornalismo/empresa e o pior mesmo é saber que essa doença já é antiga e já virou metástase. Com uma oposição que só pensa em cheirar seu próprio umbigo, mas nem por isso o lava, e uma grande imprensa que ganhou o pertinente nome de PIG (Partido da Imprensa Golpista, expressão imortalizada pelo jornalista Paulo Henrique Amorim e criada pelo deputado Fernando Ferro, do PT, em ‘homenagem’ ao jornalista Ali Kamel), fica difícil pensar no Brasil como um país de todos.


Talento de menos


Enquanto não houver uma real democratização da imprensa brasileira, com a quebra de concessões que privilegiam a poucos, a Folha, por exemplo, não terá pudor em brincar a seu bel-prazer distorcendo a todo momento declarações de quem, para eles, será eternamente uma ‘terrorista’. Sabem o que é ‘liberdade de expressão’ para a família Frias, Marinho, Civita e companhia limitada (põe limitada nisso!), cujos editorias já têm candidato há muito tempo? É mentir em manchete, fazer mea-culpa de pé de página, e ficar tudo por isso mesmo. Venderam jornal com a mentira, depois o desmentido ninguém lê. É muito mau-cheiro.


E o que dizer da menina dos olhos da família Civita, também conhecida nos bastidores da imprensa como ‘a sujíssima’? Uma certa revista semanal que seria capaz de malabarismos para provar por A mais B que o Tietê é limpo se disso dependesse a derrubada da candidatura Dilma. É claro que o mau cheiro exalado pela high society não interessa à Veja. Interessa colocar um quilo de maquiagem no candidato escolhido, moldar nele um sorriso à la Obama, fazer uma capa colorida neon e decretar que ele é o ‘pós-Lula’. Há panfletos publicitários mais imparciais.


O maior pecado do jornalismo não é ser parcial, já que a imparcialidade total nenhum ser humano é capaz de alcançar. O maior pecado, portanto, é a arte da cara-de-pau. A daqueles que se vendem como imparciais sem ser. Que sorriem para o povo e o apunhalam pelas costas. É isso o que o PIG faz, por isso é PIG. Inclusive, ultimamente, também é isso o que os EUA têm tentado fazer com o mundo. Só que não há império que dure pra sempre.


De que vivem golpistas senão daqueles a quem atacam? O que seria de Boris Casoy sem ‘os mais baixos na escala do trabalho’? Ou o que seria de Carlos Lacerda sem Getúlio Vargas? Quando Vargas se suicidou, aquele a quem os golpistas de hoje tentam imitar com bem menos talento há de ter batido no peito: ‘Foi por minha causa’. Mas não foi. E, nos anos JK, um presidente ‘bossa nova’, muito mais preocupado com a construção de Brasília do que com a enxurrada de porradas que levava diariamente da imprensa, Lacerda nunca mais foi o mesmo.


Trincheiras opostas


Um país que dê certo é o que, do alto de sua hipocrisia, todos os golpistas sempre dizem querer. Mas o que é ‘dar certo’ para eles? É seguir eternamente os passos do Tio Sam? Uma real independência não é feita de um grito em cima de um cavalo. Requer longos e dolorosos processos históricos para ser concretizada. A nossa, sem dúvida, está até hoje em construção. Avançou muito nos últimos oito anos e, ao mesmo tempo em que isso fere aos amantes da submissão, é essa ferida que os move.


O filósofo romano Sêneca definiu a raiva como ‘loucura temporária’. É grande a raiva da mídia conservadora contra um presidente que saiu do Nordeste num pau-de-arara. É igualmente grande esta a raiva contra uma candidata que na ditadura estava em trincheiras opostas as deles. E se ela não ganhar? A loucura acaba por quatro anos e, convenhamos, a sanidade não vende jornal nem, muito menos, ‘dá Ibope’.


Derrubem a Dilma e cairá o Jornal Nacional.

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Jornalista, Rio de Janeiro, RJ