Material de boa qualidade compõe o caderno Aliás do Estadão de domingo (1/1/2006). Num texto de Jurandir Freire Costa (“O gesso e o mármore”) há uma referência à mídia que merece citação:
“Sem Deus nem Política, os indivíduos viram-se, então, entregues à fantasmagórica visão de mundo criada pela cultura do espetáculo. É na realidade apresentada pela mídia que os sujeitos encontram o meio simbólico de unificar e dar sentido ao que fazem, pensam e sentem. O fetiche dos nossos tempos não é a ´neurose coletiva religiosa´, como queria Freud, ou a ´religião da mercadoria´, como queria Marx; é a aparência do mundo remetida interminavelmente a uma outra aparência, igualmente imaginada pelos fabricantes de informação.
Ocorre que a informação midiática, além de subordinar-se freqüentemente ao tacão da economia, criou um estilo de comunicação cuja pior seqüela é a corrosão da confiança do sujeito em sua autonomia como agente da história. Na linguagem do espetáculo, as misérias humanas são, em geral, associadas e assimiladas a desastres naturais, de modo que nada parece depender de nossa capacidade de resolução. Quem diz o que devemos ver, ler ou ouvir parece partir da premissa de que somos todos incuravelmente crédulos, infantis ou estúpidos para entender as causas e buscar remédios para nossos males. Conclusão: na fantasmagoria da mídia, a igualdade, a liberdade e a fraternidade jamais são o fruto do trabalho e do engenho humanos. São ´produtos` que, cedo ou tarde, sairão dos fornos dos laboratórios, das empresas de tecnologia de ponta, dos escritórios de reengenharia administrativa e das agências de publicidade. Até lá, cabe-nos esperar sentados e imitar Homer Simpson: comer pipocas e roer nervosamente as unhas, durante a final da terceira divisão de futebol entre a Groenlândia e o Usbequistão”.