Quando se ocupam da sucessão presidencial nos Estados Unidos, os jornais brasileiros publicam religiosamente os resultados das pesquisas sobre a cotação dos potenciais candidatos democratas e republicanos, cujo destino – no primeiro caso – começa a ser jogado nas primárias de Iowa, em 3 de janeiro, e de New Hampshire, cinco dias depois. A ascensão de Barack Obama, ameaçando o favoritismo de Hillary Clinton, é a grande notícia da temporada.
Mas existem outras pesquisas – tanto ou mais reveladoras da vida americana – que, se chegam às redações nos despachos das agências, são arquivadas ou apagadas sem hesitação. Pena, porque permitiriam ao leitor enxergar as causas menos evidentes da desimigração brasileira da ‘terra da oportunidade’, outrora cantada em prova e verso. A incapacidade de continuar pagando as prestações da casa própria, com os juros nos cornos da lua, é o sintoma e não a raiz do abandono do sonho americano.
O problema é que o sonho está ficando cada vez mais isso – um sonho.
É o que deixa claro uma pesquisa divulgada no New York Times de hoje sobre as expectativas de ascensão social e econômica da população. A certeza, aparentemente inabalável como a Estátua da Liberdade, de que a geração seguinte viveria melhor do que a atual, sempre foi algo tão americano como a torta de maçã.
Agora, apenas 16% dos entrevistados numa sondagem nacional conservam essa crença. Quase a metade da população acredita que as crianças de hoje estarão em situação pior do que os seus pais quando chegar o tempo de entrar no mundo do trabalho e constituir família.
Na virada do século, apareceram na mídia americana as primeiras observações de que os Estados Unidos estavam se abrasileirando – no aumento da desigualdade de renda. Desde então, esse abrasileiramento só vem se acentuando.
Não custava nada um jornal dos nossos falar disso a propósito das primárias democratas do começo do ano. Mostrando, por exemplo, que desde 1980 o Índice Gini não cessa de aumentar nos Estados Unidos. Trata-se do conhecido indicador de desigualdade econômica, que varia de 0 (igualdade absoluta) a 1 (desigualdade absoluta). Estava em 0,403. Está em 0,469.
O Brasil ainda é um país mais desigual do que os EUA e um dos mais desiguais do mundo. A tendência no entanto é para melhor. Entre 2001 e 2005, o Gini brasileiro evoluiu de 0,594 para 0,567.
E decerto quase a metade dos brasileiros adultos não acha que os seus filhos terão uma vida mais difícil do que a deles.
P.S. Pausa de fim de ano
A todos, feliz 2008. Até janeiro.