Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A imprensa celebra o fenômeno Twitter mas esquece outras aplicações do programa

A exemplo do que já aconteceu no passado com as páginas web pessoais, depois com os weblogs, com o mundo virtual do Second Life e com as comunidades online tipo Orkut, agora chegou a vez do Twitter ser elevado à categoria de modismo do momento, em matéria de novidades da internet que vendem revistas e jornais.


 


O Twitter, um sistema de micromensagens online com textos de até 140 caracteres, já tem três anos de existência e era usado basicamente para os usuários (quase todos nerds[1]) avisarem os seus amigos (seguidores no jargão dos twitters) sobre o que estavam fazendo no momento ou para os alertar sobre eventos importantes.


 


Agora, o Twitter virou a bola da vez na mídia, principalmente porque passou a ser visto também como uma forma de ganhar dinheiro. Foi isso que basicamente disparou a avalancha de matérias publicadas tanto na imprensa brasileira como na estrangeira, apoiada em estatísticas bombásticas como a que aponta o crescimento de 1.382% no número de usuários desde março de 2008.


 


Outra característica do Twitter que excitou a curiosidade da mídia é a possibilidade dos usuários serem seguidos por outros internautas. Isso não é novo, pois é a base de sistemas como o RSS e Google Reader, que informam (em tempo real, no caso do RSS) qualquer atualização em weblogs ou páginas Web indexadas pelo interessado.


 


Mas o fato de você poder saber a todo momento o que o seu guru virtual está fazendo, ou pretende fazer, foi o suficiente para um novo impulso à corrida pela visibilidade online, com internautas disputando um ranking de seguidores. Nessa corrida vale trocar listas de simpatizantes e usar o Twitter pessoal para fazer publicidade de empresas, como a Telefônica, de São Paulo.


 


Acontece que o Twitter não é só isso. Ele é usado desde 2007 como uma eficiente ferramenta de mobilização social e política, especialmente em países submetidos a regimes autoritários. As micromensagens online, junto com os “torpedos” por telefone celular, são hoje a principal forma de comunicação para organizar as chamadas flash mobs (protestos instantâneos), que já deram tantas dores de cabeça a governantes de países como o Egito, Filipinas e Bielo-Rússia.


 


Nesta ex-republica soviética, os opositores do regime autoritário usam as micromensagens para convocar manifestações, em questão de minutos, utilizando o poder de convocatória em vez dos slogans como principal arma política. Foi assim que eles realizaram em 2007 um curioso protesto no qual cerca de duas mil pessoas se reuniram na praça principal de Minsk (capital do país) para comer sorvete.


 


Motivação política da reunião foi logo identificada pela polícia — que chegou batendo e, é claro, pipocaram fotos de manifestantes agredidos e presos. Minutos depois, tudo isso já estava no site de vídeos YouTube e no Flickr, de fotografias. Daí para as redações dos jornais foi um passo.


 


O governo sentiu o golpe e passou a monitorar a circulação de mensagens instantâneas, o que levou os opositores a uma estratégia de gato e rato para reunir pessoas em locais públicos. Na verdade, criou-se uma nova cultura de protestos políticos, onde o que importa é mostrar capacidade de mobilizar pessoas por meio de recursos como o telefone celular, os blogs pessoais e agora também o Twitter.


 


Motivações aparentemente prosaicas como uma multidão comendo sorvete numa praça, ou lendo um mesmo jornal, tornaram-se tão eficientes, como forma de protesto, quanto os slogans políticos.


 


O modismo Twitter vai passar como passaram todos os anteriores, mas o programa continuará como mais uma forma de comunicação criada pela Web. Ele se integra e complementa todos os demais — como os blogs, comunidades sociais online, páginas web, RSS, YouTube etc. O Twitter, como todos os outros, tem vantagens e limitações, cabendo ao usuário identificar o quanto ele é mais adequado ou não.


 


Já a imprensa deveria dar-se conta de que o hábito de criar modismos é tão efêmero quanto os próprios. Trata-se de um expediente editorial que visa apenas estar na onda, e que impressiona mais os que estão fora da Web do que os usuários da rede. Essa visão imediatista dificulta o desenvolvimento de uma percepção mais realista de como um software como o Twitter pode ajudar na criação de redes capazes de resolver problemas sociais. 






[1] Nerds é uma expressão inglesa usada para identificar fanáticos pela Web.