Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Jornalismo hiperlocal: luz no fim do túnel

Pelo quarto ano consecutivo o informe State of the News Media 2012  dedica um espaço especial ao jornalismo local, apontado como uma das grandes tendências no desenvolvimento da imprensa nos Estados Unidos e no mundo. Ao longo destas quatro edições, o enfoque dos autores dos informes vem se tornando cada vez mais otimista, embora reconhecendo que este nicho do jornalismo ainda enfrenta inúmeros dilemas.

A preocupação dos norte-americanos em explorar as potencialidades do jornalismo praticado em escala local e hiperlocal (ruas, bairros ou pequenas cidades)  contrasta com a nossa despreocupação com um tema, que pode não interessar às empresas jornalísticas, mas tem implicações diretas e palpáveis na forma como os brasileiros têm acesso à informações que afetam diretamente o seu dia a dia em casa, no transporte, no trabalho e na diversão.

Desde o State of the News Media 2010, os autores do informe defendem a tese de que a cobertura local é uma opção que não pode ser descartada no momento em que a imprensa está sendo obrigada a rever seu modelo de negócios.  Esta alternativa tornou-se viável com o surgimento das novas tecnologias de informação e comunicação que facilitaram enormemente a produção autônoma tanto por profissionais independentes como por amadores.

Na edição deste ano, o informe já não se limita a falar apenas das potencialidades do jornalismo local, mas enumera algumas receitas com base na análise das experiências de projetos fracassados e exitosos. Trata-se de experiências que deveriam ser adaptadas ao contexto brasileiro porque a demanda por informação comunitária sempre existiu, o problema é que as empresas não tinham e não têm condições financeiras para arcar com os custos da cobertura local, que exige muita gente para cobrir, por exemplo, os 154 bairros de uma cidade como São Paulo.

Hoje já não há  mais dúvidas de que a cobertura jornalística local e hiperlocal só é possível com a participação do público na produção de notícias. Mas  a experiência também mostrou que não adianta centenas de pessoas começarem a mandar fotos ou notícias para um jornal porque ele não terá condições para processar todo esse material. A alternativa óbvia são sites de noticias produzidos por jornalistas independentes, que funcionam como intermediários entre o cidadão e a imprensa. Acontece que essa modalidade de jornalismo enfrenta o dilema da sobrevivência financeira; até agora, o índice de mortalidade das iniciativas era desencorajador. 

Segundo o informe 2012, já é possível ver luz no fim do túnel.  A principal constatação é a de que são viáveis parcerias entre os independentes e as empresas, mediante a troca de conteúdo por audiência, no caso de microempreendedores, ou por experiência, no caso de sites noticiosos locais patrocinados por escolas de jornalismo para formar profissionais.  É um acordo bom para os dois lados e que garantiu a sobrevivência de projetos como o Grand Avenue, um site de notícias hiperlocais sobre o bairro de Coconut Grove,  em Miami,  produzido por estudantes da Universidade da Flórida em parceria com o jornal Miami Herald.

No caso dos jornalistas independentes, eles fornecem conteúdos para empresas jornalísticas em troca de visibilidade e acesso ao grande público. Esta parceria é cada vez mais comum em jornais regionais norte-americanos, uma vez superados os problemas de desconfiança mútua. O problema é que os independentes não tinham os conhecimentos necessários em empreendedorismo para tornar sustentável a sua atividade. 

Hoje nos Estados Unidos já existem grandes consórcios de jornalistas, como o  Authentically Local  formada por 60 sites locais, e a rede Patch, criada pela America Online (Aol) e presente em 23 estados norte-americanos. O amadurecimento das experiências de cobertura local e hiperlocal provocou o surgimento de cursos de empreendedorismo informativo em cerca de 20 universidades, também nos EUA.

Para os novos empreendedores jornalísticos a grande dica é a diversificação das fontes de renda, variando desde a inserção de banners publicitários até a produção de reportagens patrocinadas, como  no caso do site Spot Us.  Tratam-se de reportagens  investigativas, de serviços ou coberturas de eventos pagas  por cidadãos interessados em obter informações sobre fatos e processos de interesse público.

Outra alternativa para assegurar a sustentabilidade de sites noticiosos locais é o da diversificação de fontes de renda. Para que esse tipo de projeto dê certo é essencial a prática de um jornalismo de imersão na comunidade, a exemplo do  que fazem alguns sites como o das cidades Tarrytown e Sleepy Hollow, em Nova York. Nessa estratégia é indispensável  uma interação ampla e constante entre os jornalistas e a comunidade para  que as duas partes identifiquem oportunidades de colaboração mutuamente interessantes.

As novas possibilidades de autofinanciamento de projetos jornalísticos locais não garantem sucesso automático porque cada situação é diferente. Segundo os especialistas consultados pelo State of the News Media 2012 , a taxa de mortalidade empresarial no setor ainda é muito alta, mas pelo menos surgiram mais iniciativas novas  em 2011 do que as que naufragaram no mesmo ano.